quinta-feira, 20 de maio de 2010

Educação intercultural ambiental e religiosidade afro-brasileira

Educação intercultural ambiental e religiosidade afro-brasileira

Profa. Dra. Cristiana Tramonte /CED/UFSC/ NÚCLEO MOVER

O povo-de-santo (praticantes das religiões afro-brasileiras) como parte da população desprivilegiada socialmente, integra a parcela diretamente atingida pelos desequilíbrios ambientais e conseqüente escassez de recursos, que geram o desaparecimento de indispensáveis elementos rituais, ameaçando a tradição e causando perdas espirituais, já que, particularmente na Umbanda e Candomblé os elementos naturais são fundantes dos dogmas religiosos.
A urbanização - e consequente degradação ambiental - são vistas como responsáveis por este processo e a mercantilização seu resultado mais imediato, nivelando aparência e essência. O caminho possível é a construção de alternativas rituais, com a aquiescência das divindades.
Pela centralidade que a ecologia cumpre na espiritualidade afro-brasileira, a religião é responsável por estruturar a visão dos adeptos e, em alguns casos, resulta em iniciativas no cotidiano ritual e material que visam à maior preservação. Compreende-se que a falência dos elementos naturais resulta em falência espiritual e religiosa.
Neste caso, entende-se que os denominados “terreiros”, locais aonde se pratica a religiosidade afro-brasileira tem uma função educativa nos planos intercultural e ambiental, normatizando hábitos e criando valores éticos junto a seus integrantes.
Sob o prisma da Intercultura, as práticas das religiões afro-brasileiras apresentam-se como um campo híbrido de construção de identidade no qual emergem novas estratégias de organização que apontam novas perspectivas para a educação intercultural.
As religiões afro-brasileiras, cujo comando cultural pertence à população negra, congregam a diversidade das origens étnicas e culturais do país, consolidando-se como signos de “brasilidade”. O artigo aqui proposto visa a apresentar a experiência educativa comunitária e intercultural de dois grupos, dois “terreiros” de prática religiosa, completando assim, um ciclo de significações que tenta compreender a problemática do ponto de vista de sua complexidade e da integralidade quando tratamos dos sujeitos destas vivências.
Essa multiplicidade de inter-influências produz um campo eminentemente educativo no qual os desdobramentos não são unívocos, mas múltiplos e complexos; é esta relação que produz o campo intercultural.
Entende-se Intercultura conforme a define Giacalone (1998): esta colocada a relação intercultural quando as diferentes dimensões entram em relação, “colocam-se em jogo”: “Se a multiculturalidade pode ser a convivência ...entre grupos distintos, a intercultura é a possibilidade de um projeto, de uma troca, na qual existe a reciprocidade de olhares e de intenções, na qual se dá o confronto entre identidade/diferença”.
Este é um universo de significados de extrema relevância se tomarmos em consideração os fanatismos e extremismos de toda ordem que surgem e ressurgem nesta virada de milênio.
Nas relações endógenas dos grupos religiosos afro-brasileiros, analisaremos especificamente o trabalho de formação e desenvolvimento desenvolvido pela Tenda Cabocla Marola do Mar, como forma de ilustrar como ocorre a prática educativa. 434
SEMEANDO O FUTURO: a Natureza e o povo-de-santo
As religiões afro-brasileiras tem como uma de suas bases a confluência entre divindades e natureza, construindo uma totalidade. Esta característica é ainda mais marcante no candomblé. Lody (1987) descreve como a Roça do Ventura, na Bahia, um candomblé “exemplar”, mantém em equilíbrio a natureza no qual se instala: árvores e rios são moradas de divindades, folhas sagradas (e medicinais) são plantadas e mantidas, uma mata abriga a memória dos “voduns” e as construções são feitas basicamente com materiais rústicos, além dos animais criados soltos e integrados. No candomblé não há representação de elementos da natureza, mas as divindades são os próprios elementos da natureza1. A movimentação corporal, as danças, a arte, os objetos, tecidos, comidas e todo um vasto conjunto de elementos simbólicos articula-se na busca da integração à natureza, ou seja, às divindades.
Segundo ainda o autor, o candomblé, originário da África, é uma congregação de sobrevivências étnicas que teve grande disseminação e reinterpretação como cultura afro-brasileira em nosso país, uma produção cultural que constrói a aliança entre os planos do sagrado e do humano. A sociedade do candomblé é controlada e protegida por dois elementos fundamentais: a natureza, o meio ambiente, corporificados e santificados nos orixás e as expressões dos antepassados. A música, dança, canto, gestos e alimentos emanam a força vital e as máscaras, esculturas, adornos e pinturas contribuem na unidade do grupo social, simbolizando seus ciclos e passagens. “Assim, a energia da natureza e os heróis e reis divinizados são alguns dos principais motivos do plano do sagrado, íntimo e cotidiano para o homem africano. Esta presença está na casa, no santuário, no comércio, nas tarefas, nos campos, nos rios, no mar, no desenvolvimento das técnicas artesanais...desenhando dessa maneira o próprio ser cultural.” (p.9)
Dentre o povo-de-santo, a relação mais estreita com a Natureza é dos adeptos do candomblé, pela sua essência mesma. Entretanto, os outros rituais aqui analisados - Umbanda e Almas e Angola - também conservam esta ligação em graus diferenciados, pois, como já vimos anteriormente, na Grande Florianópolis é significativa a marca da “africanização” nestes cultos. Isto se explica, entre outros fatores, pelo fato de que a Umbanda - a protagonista das religiões afro-brasileiras locais – surge como uma estratégia de abertura de espaços, mas, na verdade, manteve enérgicos traços de africanização nas práticas e preceitos, ao contrário de outros locais do país, nos quais preponderou, em alguns momentos, o “embranquecimento”. Já Almas e Angola é, ela própria, derivada da Umbanda “mesclada com o candomblé”, como sintetizaram vários depoimentos.
Assim, podemos generalizar no caso da Grande Florianópolis, afirmando que as religiões afro-brasileiras aqui estudadas tem como um dos pilares fundantes míticos a harmonia com a natureza, guardando as gradações diferenciadoras entre candomblé, Almas e Angola e Umbanda. Por esta representação inspirada na Natureza, sofrem os impactos da
1 Como ilustração podemos citar, no candomblé Gêge-Nagô as seguintes correspondências entre orixás e elementos naturais: Exu, fogo; Ogun, fogo, ar, ferro, minerais; Oxóssi, mata; Obaluaiê, terra; Ossaim, folhas, plantas; Oxumaré, arco-íris; Xangô, raio, trovão; Oxum, água doce; Iemanjá, água salgada; Iansã, vento, tempestade; Oxalá, ar. Silva, 1994 435
degradação desta e passam a alterar progressivamente seu desenvolvimento ritualístico e até mesmo dogmático visando à adaptação.
Em períodos históricos anteriores2, quando o processo de urbanização não havia se intensificado como neste final de século, o povo-de-santo buscava estabelecer os terreiros em áreas com vegetação pujante aonde pudesse desenvolver os rituais de oferecimento e homenagem ao santo. Com o escasseamento de tais áreas e conseqüente valorização imobiliária, tornou-se impossível manter nestes locais as casas de culto, e estas passam a sediar-se nas habitações mesmas dos sacerdotes, geralmente localizadas em áreas urbanas com pouco espaço livre para o cultivo de elementos da natureza, tanto de árvores sagradas, como das plantas essenciais à manutenção espiritual dos rituais e do grupo.
As conseqüências desta transformação são inúmeras, gerando preocupações entre o povo-de-santo. O desaparecimento de espécies essenciais, principalmente da flora, e a degradação em geral dos elementos naturais estão entre as mais mencionadas. O desaparecimento gera, historicamente, o desconhecimento, que ameaça a preservação da tradição, outro grande motivo de apreensão entre os religiosos:
“Você não está encontrando mais um comigo-ninguém-pode3 lá na mata, ninguém sabe o que é um quebra-macumba, um cipó milombo4, e naquela época todo umbandista conhecia. Hoje você não tem mais. A Rosita foi até Porto Seguro para encontrar a baguinha de São Thomé, coisa que no morro você encontrava”. (Mãe Graça)
“A gente vê com muita preocupação porque a hora que acabar Oxum no nosso planeta acabou tudo. O ouro de Oxum é água potável. Aí vão morrer as árvores, animais, consequentemente ou o homem vai migrar para outras esferas porque já destruiu aqui mesmo, ou vai ter uma consciência de preservação muito grande. A situação está ficando difícil. O que quero de folhas eu tenho, mas tem plantas que só tem lá prá cima porque o clima é mais quente. E se acabar a de lá? Substitutas existem, mas tem as imprescindíveis, aí o elo perdido se acabará”. (Pai Juca)
A degradação dos elementos naturais essenciais para os preceitos implica grande perdas espirituais, na opinião de alguns adeptos, criando um certo constrangimento entre religiosos e divindades. O “improviso” requerido pela falta de condições próprias nem sempre é encarado como a solução ideal, mas como a única saída em alguns casos:
“Era bom quando tinha natureza porque ali puxa corrente de força. Aonde está tudo desmatado hoje, nem tem local para a gente assentar uma obrigação ritual certo, onde vai encontrar mata virgem? Isso é uma quebra muito grande pro santo e para a gente, porque a entidade fica cobrando quando a gente não arreia as obrigações certas. A gente arreia como pode, aonde pode arriar.” (Mãe Cristina)
2 Registros históricos informam a existência de calundus no século XVIII, que teriam antecedido às casas de candomblé do século XIX e atuais terreiros de candomblé. Silva, 1994.
3“Comigo-ninguém-pode = planta ornamental...usada para proteger pessoas e ambientes contra maus fluidos”. Cacciatore, 1988
4 Também conhecido por Cipó-mil-homens: Bom para aliviar o estômago. Silva, 1993. Nomes vulgares: angelicó, aristolóquia, capa-homem, cipó-mata-cobras, giboinha, jarrrinha, milhomens, papo de galo. Camargo, 1998 436
“Fica difícil com a falta de espaço. A imagem de uma casa-de-santo era a roça: ervas, bichos, fogão a lenha, tudo na base da natureza, pode plantar e criar tudo necessário para o ritual. Só que hoje a maioria dos terreiros não tem espaço...quanto mais passa o tempo, vai fechando mais casas por causa disso.” (Pai Leco)
A urbanização, que resulta em estreitamento dos espaços e degradação dos recursos naturais é vista como uma das responsáveis pelas rupturas: no plano espiritual, implicando em profundas alterações da essência dos preceitos; no plano material, resultando no fechamento de terreiros e conseqüente enfraquecimento da religião. A urbanização surge assim, como um desafio, diante do qual alguns sentem-se impotentes:
“O rapaz comprou terreno no Córrego Grande onde passa cachoeira, vai construir o barracão dele. Só que já estão cercando. A CASAN já cortou, não tem mais queda d’água. São coisas que o desenvolvimento está tirando e a gente não sabe como impedir...Temos que fazer o amaci5 de madrugada, fazer as rezas, ir prá mata, pedir a Ossanha e recolher as ervas, no sereno, energizadas. Se já apanhou as ervas há muito tempo, não tem mais vida, acabou. Precisa uma mesa de obrigação prá Exu. Tem que procurar o encruzo de chão batido, está dificílimo, tudo asfalto. Campo não tem mais e quando tem, você não pode ir porque os vizinhos não deixam você fazer oferenda...Os sacudimentos6 que eu fazia nestes locais não tem mais condições, faço dentro do barracão, depois levo e entrego lá. Iaô eu levo na cachoeira, quase ganhei uma corrida lá do Poção, a mulher achou que não podia fazer lá, que ia sujar as águas, mas insisti e fiz.” (Pai Leco)
Ao mesmo tempo em que os rituais sofrem transformações advindas da deterioração ambiental, a religião é responsável também por estruturar a visão ecológica desta população. Neste sentido, contribui para uma preocupação maior com a questão, já que a busca permanente pela harmonia entre ser humano e natureza lhe é inerente. Esta procura constante sobrevive nas adversidades, dinamicamente, transformando-se continuamente, agregando novos membros, redefinindo valores e posturas e confrontando espiritualidades ancestrais com novas exigências. Prova desta contribuição é que, na Bahia, nos anos 80, entre as conquistas do “povo-de-santo” daquele estado está a inclusão na Constituição Estadual da obrigatoriedade de preservação de mananciais, flora e sítios arqueológicos vinculados à religião afro-brasileira.
“O negro sempre teve cuidado com meio ambiente, porque é aí que está o orixá, na cachoeira limpa vive Oxum, na mata bem cuidada Ossaim cuidando das folhas; na chuva que cai, está Iansã. Se você for numa casa-de-santo e não tiver erva plantada não é casa-de-santo. No mínimo tem que ter arruda ou comigo-ninguém-pode ou do santo da casa, ou do Exú; ou mariuô7, peregun8, um saião9. Sem as ervas não tem orixá, orixá não responde.” (Pai Leco)
5 “Amaci = líquido preparado com folhas sagradas.” Cacciatore, 1988
6 “Cerimônia ritual para limpar e purificar a pessoa.” Cacciatore, 1988
7 “Mariuô = saiote de folhas de palmeira desfiadas que Ogun veste em certas cerimonias de candomblé. Colocado na entrada da casa, afasta os eguns.” Cacciatore, 1988
8 “Peregum = planta usada no candomblé para diversas finalidades: serve para cerca, e, na África é muito usada nos bosques sagrados como limite. Parece ser o chamado pau d’água.” Cacciatore, 1988
9 “Saião = folha-da-costa e folha-da-fortuna.” Cacciatore, 1988 437
“Há uma ligação do povo-de-santo com a natureza: ervas, frutas, folhas, árvores, etc. Só que muito antes de usar esse nome ‘ecológico’ a Umbanda e o Candomblé já usavam a natureza com respeito, porque cada elemento é um ser que merece respeito porque corresponde a um orixá.” (Yalorixá Elzeni)
O relatório sócio-ambiental sobre Florianópolis “Uma cidade numa Ilha” (CECCA,1996) aponta que, com o avanço da urbanização, a população rural foi perdendo os meios de produção e reprodução de sua cultura, os espaços de produção da vida simbólica, suas brincadeiras, histórias e referências. Entretanto, em relação à população de origem negra e suas práticas culturais não se pode dizer que tenha havido simplesmente uma trajetória de desintegração. Com o fenômeno da urbanização, surgem, por exemplo, as entidades associativas, entre elas, os terreiros e Federações das religiões afro-brasileiras que representarão um signo de resistência cultural, expansão social e fortalecimento comunitário importantes para o enfrentamento dos novos desafios. Embora, em nível local, as religiões afro-brasileiras não congreguem exclusivamente a população negra, nascem e crescem sob inspiração de suas raízes culturais e, historicamente, aglutinaram grande parte da população pobre, que aí encontrou espaço e oportunidades de desenvolver-se espiritualmente, constituindo a maioria dos adeptos.
Como parte da população desprivilegiada socialmente, o povo-de-santo também integra a parcela diretamente atingida pelos desequilíbrios ambientais e conseqüente escassez de recursos. Deléage (1993) indica a importância que exercem as representações que as sociedades fazem de sua relação com a natureza, na medida em que podem incrementar práticas devastadoras ou, ao contrário, buscar inibi-las. A prática religiosa representa, de fato, um elemento que vem somar-se à tomada de consciência sobre a questão e, em alguns casos, resulta mesmo em pequenas iniciativas no cotidiano ritual e material que visam a uma maior preservação:
“Entrou uma jararaca no quarto do santo, foi prá debaixo de Iansã. Uma irmã minha queria matar a cobra. Não deixei! Se ela foi se abrigar debaixo da Yansã da casa, vou matar? Isso aqui era um horror de tanta cobra! Não sabia o que fazer! Aí na Bahia disseram prá eu assentar Oxumaré! Fiz um pepelê10 para assentar o orixá. No dia aparece uma coral no portão. Eu disse: ‘põe ela para fora, mas não mata!’ Daqui a pouco passou uma jararaca. Foi só acabarmos de preparar tudo, estava a coral toda enrolada, depois do axé feito. Então, bati a cabeça no chão, dei paó11, a coral desceu, foi embora e até hoje nunca mais apareceu. Ela veio saudar o axé.” (Pai Juca)
“Vai na cachoeira deixar oferenda e larga completamente suja. É uma agressão, você não está contribuindo, está agredindo a natureza. Se o orixá é natureza, se Oxum é a cachoeira, como vou virar as costas e deixar sujeira?” (Mãe Tereza)
10 “Pepelê = altar dos orixás, quando em forma de prateleiras, às vezes de cimento, dentro do ilê-axé (casa do axé) onde estão colocadas as vasilhas com os assentamentos, vestidas, muitas vezes, com as roupas dos orixás.” Cacciatore, 1988.
11 “Paó = Palmas que servem como sinal de que se necessita comunicar algo (por gestos, pois não se lhe pode falar) à iniciando em recolhimento na camarinha.” Cacciatore, 1988. 438
“Fui a Santo Amaro, Lages, joguei sementes lá. Tem que contribuir de alguma forma. Atrás da casa tenho arruda, guiné, erva da jurema, quebra-macumba, babosa e já plantei em alguns pontos...Quando saio, vou com um saco de sementes jogando por aí...Tenho respeito com a natureza, quem é espírita tem que fazer isso.” (Valcir)
Há uma clara consciência da necessidade do cuidado com a natureza, até mesmo como estratégia de neutralização do preconceito e de construção da aceitação da opinião pública em relação às religiões:
“Nosso terreiro vai na praia de São Miguel, a gente toma cuidado com as oferendas: não pode deixar embalagem de plástico, nada que polua. Os médiuns têm consciência de que nossa religião é muito criticada, sofrem preconceito e falam: ‘vamos limpar tudo prá ninguém falar da gente.” (Mãe Eldeni)
Os terreiros são vistos por alguns adeptos como potenciais formadores de uma consciência ecológica:
“Aqui em casa, todo mundo é doutrinado: ninguém vai entregar oferenda e deixar lixo. Isso é uma das causas que estão tirando nosso espaço...É mais fácil a comunidade aceitar você se não fizer sujeira, vendo fazer um trabalho, as águas estão ali, joga arroz, feijão, o peixinho come. Agora joga sacola de plástico vai sujar a cachoeira. Tem que partir das casas-de-santo esse cuidado, a educação dos membros.” (Pai Leco)
A exemplo do que ocorre com outros temas relativos ao povo-de-santo, também em relação à preservação dos recursos naturais, a autocrítica deste é implacável quando fala de seus pares: não isenta de responsabilidade os adeptos e não hesita em inclui-los claramente entre os culpados pela degradação. Embora os religiosos reconheçam que está em curso um processo de desequilíbrio ecológico que tem causas macroeconômicas, sociais e políticas, apontam a participação do povo-de-santo na deterioração ambiental. Entre suas ações, uma das mais auto-criticadas é o depósito de lixo nos locais de oferendas e obrigações às entidades espirituais:
“Vi uma placa no Poção que achei linda: ‘A comunidade aceita que na mata moram os espíritos e espírito não se alimenta de lixo.’ Estão corretos! Arria sua oferenda, o que for saco plástico, vidro, trás de volta! Você vai, deixa tudo lá, se cada um fizer isso, está aquele monte de lixo, acabou.” (Pai Leco)
Além da deterioração ambiental causada pelos próprios religiosos e severamente censurada em nível interno, por resultar inclusive em descaracterização espiritual, outra preocupação do povo-de-santo neste sentido é com a comercialização indevida de produtos essenciais. Quer dizer, há uma clara percepção de que a urbanização, da forma como ocorre atualmente, um dos motores da degradação dos recursos naturais, cria dificuldades para a manutenção das antigas práticas, notadamente aquelas que implicavam numa relação mais estreita com a natureza, tais como oferendas em matas, cachoeiras e localização de plantas para os rituais. Tais dificuldades acabam abrindo caminho e favorecendo práticas que os religiosos consideram ilícitas, tais como a venda de produtos religiosos que, comercializados, perdem o sentido e o valor espiritual. Eles apontam recorrentemente o 439
caso das ervas para determinados preceitos, que, para serem eficazes do ponto de vista ritualístico, deveriam ser plantadas, colhidas e secadas com determinações divinas bastante rígidas.
“A erva que já está seca, numa emergência tudo bem. Agora cultivada tem muito a ver com a nossa energia que cuida daquela planta: você prepara aquela terra, vê a planta crescer, vibra com uma folhinha nova, aquilo só vai fazer bem para alguém.” (Rosita)
“Dependendo da sessão, processo 3 ervas prá defumação. Quem dá o encaminhamento é a entidade, prá harmonizar meu terreiro. Só que pode não ser o mesmo para outro, não tem receita pronta. Por isso comprar não tem valor, porque não está de acordo com a entidade, é qualquer coisa. As ervas são colhidas nas horas próprias, cada erva tem um horário vibratório:” (Pai Elisson)
Diante da degradação e da impossibilidade de manter as tradições, surgem as alternativas rituais. Estas direcionam-se principalmente no sentido de procurar manter a essência religiosa em condições adversas resultantes das transformações na natureza e no meio ambiente em geral, contando, evidentemente, com a condescendência e apoio das entidades espirituais.
“Senão puder fazer como manda a tradição, realiza de outra forma. Não pode botar obrigação prá Exú numa encruzilhada de barro por causa do asfalto, vai no mato, peça licença à Ossaim, à Oxossi e pode botar a obrigação: ele anda em todos os pontos, vai aceitar! Ou entrega para as águas que é o início da vida. Os matos estão cada vez mais distantes. Se não pode dar comida ao orixá, enterra. A terra come, porque é viva, o orixá recebe.” (Pai Edemilson)
“Corre-se o risco de comprar algo que não seja o que se está procurando. Mas eu confio muito no plano espiritual. Se não for aquilo, eles [guias espirituais] energizam de uma forma que a finalidade vai ser atingida”.(Mãe Eldeni)
Diante da degradação, alguns adeptos buscam garantir uma área que possa fornecer o equilíbrio natural e os elementos necessários aos rituais, resultando em verdadeiras estratégias de sobrevivência espiritual:
“Tenho o sítio da família. Quando preciso vou colher folhas de manhã; ervas e folhas de santo tenho no quintal, ainda dá prá fazer!” (Pai Edemilson)
“Temos um terreno na praia, tenho todas as ervas que a gente precisa e quando não tem, vou atrás. Aqui tem dois pedacinhos de chão, já estou preparando as mudas, porque às vezes a Vó está em terra e precisa naquela hora. Vai um pouco da criatividade: não dá para ter um canteiro, faz um vaso.” (Rosita)
Mesmo diante das inúmeras dificuldades para manter a relação entre religião e natureza, o povo-de-santo demonstrou estar considerando esta como um eixo fundamental, que articula as dimensões espiritual e material. A vida no planeta e a regência dos orixás 440
estão densamente interligadas nos elementos naturais, de maneira que interdependem para sobrevivência ou para desintegração.
“Não se consegue fazer Iaô sem ir à mata. A partir do momento que não tiver, acabou tudo, a vida também. Não só morrem todos os orixás como também os seres humanos. O próprio orixá está perdendo a força dele na natureza porque cada desmatamento é uma parte de Oxóssi e Ossaim que morrem. Cada cachoeira que seca é parte de Oxum morrendo...São os orixás que controlam a natureza. Eles não controlando, não existe mais possibilidade de vida.” (Pai Edemilson)
“Nós, seres humanos, é que estamos destruindo. Não é um orixá contra o outro. Estamos destruindo a área do orixá. O dia que não tiver mais ervas em todo o território nacional, o orixá Ossaim sumiu. E se um orixá faltar, tudo desaba. Se um guardião sair, acaba tudo.” (Pai Leco)
Existe a percepção clara de que há um descontrole que foge ao poder dos orixás. Por isso, o futuro é uma incógnita para o povo-de-santo, que vê a degradação com apreensão.
“Vocês acham que o homem está procurando o quê na Lua, Marte? No momento que o homem fizer colônia lá, ele não está mais preocupado com a ecologia do planeta. Nosso mundo vai acabar quando Xangô, rei dos astros, mandar os meteoros para o céu e destruir, mas acho que a Terra ainda é recuperável. Tem que criar outra consciência de preservação.” (Pai Juca)
Entretanto, o povo-de-santo não está isolado em suas preocupações. Como rede religiosa, expressa preocupações que vem progressivamente ocupando a cena quando se trata do debate sobre meio ambiente, aí incluída a questão da natureza. O Tratado de Educação Ambiental do Fórum Global Rio-92 já especificava a necessidade de uma perspectiva que promovesse a diversidade cultural como pré-condição para a construção de uma sociedade ecologicamente sustentável. Para isto, a participação comunitária também é considerada uma articulação local fundamental para refletir sobre a dimensão global, o que remete à importância da rede do povo-de-santo nesta discussão. Valorização de tradições culturais e promoção das redes locais até as mundiais, são algumas das metas apontadas pelo Tratado e que dizem respeito aos adeptos das religiões afro-brasileiras.
A seguir, examinarems a dinâmica interna de um terreiro e seus processos educativos interculturais
A dinâmica metodológica da educação intercultural e ambiental
Sob o prisma da Intercultura, as práticas das religiões afro-brasileiras apresentam-se como um campo híbrido de construção de identidade no qual emergem novas estratégias de organização que apontam novas perspectivas para a educação intercultural.
As religiões afro-brasileiras, cujo comando cultural pertence à população negra, congregam a diversidade das origens étnicas e culturais do país, consolidando-se como signos de “brasilidade”. O artigo aqui proposto visa a apresentar a experiência educativa comunitária e intercultural de dois grupos, dois “terreiros” de prática religiosa, completando assim, um ciclo de significações que tenta compreender a problemática do 441
ponto de vista de sua complexidade e da integralidade quando tratamos dos sujeitos destas vivências.
Essa multiplicidade de inter-influências produz um campo eminentemente educativo no qual os desdobramentos não são unívocos, mas múltiplos e complexos; é esta relação que produz o campo intercultural.
Entende-se Intercultura conforme a define Giacalone (1998): esta colocada a relação intercultural quando as diferentes dimensões entram em relação, “colocam-se em jogo”: “Se a multiculturalidade pode ser a convivência ...entre grupos distintos, a intercultura é a possibilidade de um projeto, de uma troca, na qual existe a reciprocidade de olhares e de intenções, na qual se dá o confronto entre identidade/diferença”.
Este é um universo de significados de extrema relevância se tomarmos em consideração os fanatismos e extremismos de toda ordem que surgem e ressurgem nesta virada de milênio.
Nas relações endógenas dos grupos religiosos afro-brasileiros, analisaremos especificamente o trabalho de formação e desenvolvimento mediúnico desenvolvido pela Tenda Cabocla Marola do Mar.
Em suas relações exógenas, procuramos desvendar o trabalho educativo intercultural comunitário desenvolvido pela Tenda Caboclo Cobra Verde.
O trabalho de educação intercultural na Tenda de Umbanda Cabocla Marola do Mar
Vários centros religiosos desenvolvem, junto a seus médiuns, um trabalho de formação e desenvolvimento, que caracteriza uma ação intercultural em seu sentido mais amplo. Segundo Fleuri (1999) “na atividade formativa ressaltam-se as formas e conteúdos da cultura interiorizada pelos indivíduos na vida cotidiana, a variedade ...das experiências com que estabelecem contato...” É nesta perspectiva que analisaremos o trabalho desenvolvido pela T.U. Cabocla Marola do Mar pela excelente sistematização do trabalho, confecção de material pedagógico e pelo lugar central que a preocupação educativa ocupa no grupo como um todo. A atividade de estudo e pesquisa da Tenda atua como um suporte das ações de atendimento e desenvolvimento.
A Associação Beneficente Tenda de Umbanda Cabocla Marola do Mar é uma sociedade civil, pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, de caráter cultural, educacional, social e filantrópico “voltado especialmente para o estudo e difusão da cultura afro-brasileira”12. A mãe-de-santo (ou chefe-de-terrreiro) responsável é Eldeni Fernandes Camargo.
Entre seus objetivos estão o estudo, prática e divulgação da cultura afro-brasileira, a prática da caridade como dever social e princípio de moral e como exercício pleno de solidariedade e respeito ao ser humano. Além disso, promove o desenvolvimento de trabalhos educacional, esportivo, social e de defesa e benefício da comunidade na qual a Tenda se insere. Embora a Tenda pratique, de fato, os dois últimos aspectos citados, nos deteremos no primeiro, aquele que diz respeito diretamente à compreensão e prática religiosas, inseridas num contexto macro de cultura afro-brasileira.
A organização institucional segue a configuração tradicional: presidente de honra, presidente e vice-presidente, primeiro e segundo secretários, primeiro e segundo tesoureiros e diretores de departamentos.
12 Estatuto social. Associação Beneficente Tenda de Umbanda Cabocla Marola do Mar. 13 de maio de 1996. 442
A organização religiosa é formada por um conjunto formado pelos guias espirituais13, médiuns e pela chefe de terreiro Mãe Eldeni, filha de Iemanjá e Ogun e entidades, tendo como guia de frente14 a Cabocla Marola do Mar e Omolocô Caboclo Lírio Branco (coordena todos os trabalhos realizados na tenda, sob orientação da primeira)15
Eldeni exemplifica como se dá o acolhimento e definição das funções dos médiuns e suas entidades, em um auto-aprendizado coletivo das “linhas” que vão se agregando e num processo de contínua transformação, totalmente aberto à inclusão de novas contribuições espirituais e coerente com a opção democrática preponderante neste centro.
“A Cecília começou como cambona, e depois veio o Omolu. A Milena tem o Povo do Oriente. Ela veio e ensinou a todos como era. Se chegar outras entidades (marinheiro, baiano), a gente vai incluindo”.
O cronograma dos trabalhos inclui o revezamento das sessões destinadas às entidades com os períodos de estudo, atendimento e desenvolvimento, assim descritos pela mãe-de-santo.
“Segunda é atendimento: médiuns e entidades se revezam. Esses que estão começando não dão atendimento, ficam só na corrente16; na quinta, é desenvolvimento: cada um chama suas entidades para atender os médiuns. Quando o médium começa, perde muito o equilíbrio. No desenvolvimento ele vai se concentrando mais, se firmando... pode se exercitar...então, não é para o público, é só para os médiuns porque eles também querem conversar com os guias que incorporam aqui.”
13 Dados retirados sem alterações da Agenda Umbandista. ABTUCMM, 1999. Outras entidades da Tenda - Linhas* de Povo d’água - Cabocla Marola do Mar; de Caboclos – Caboclo Lírio Branco (Caboclo de Xangô); Cabocla Juremi (Cabocla de Oxoce); de Ogum – Ogum Sete Espadas; de Xangô - Xangô de Alafim; de Oxalá (Almas) - Preto Velho Pai Tomás; Rita Benedita; de Erê - Mariazinha; do Oriente - Princesa Iara; Ciganos – Carmem; Exús: Pomba Gira Maria Padilha; Exú Sete Capas.
Coordenador dos Trabalhos de Estudo do Evangelho: Irmão Lázaro.
* “Linha = faixa de vibração, dentro da grande corrente vibratória espiritual universal correspondente a um elemento da Natureza, representada e dominada por uma potência espiritual cósmica, um orixá também chamado Protetor e que é chefe dos seres que vibram e atuam nesta faixa afim...É subdividida em Falanges, dirigidas por representantes do orixá...” Cacciatore, 1988
14 “Guia de frente = o mesmo que ‘orixá de frente’. Guia principal da pessoa, seu Protetor, seu anjo-da-guarda. Também ‘guia de cabeça”. Cacciatore, 1988
15 Na parede do centro há um lembrete: “A tenda de Umbanda que freqüentas é coordenada pela entidade Cabocla Marola de Mar: é ela que zela por ti e tuas entidades. Nada é feito sem sua aprovação. O Caboclo Lírio Branco, caboclo de Xangô é a entidade encarregada pela nossa guia espiritual de dirigir todos os trabalhos de desenvolvimento, desobsessão* limpeza magnética** organização das sessões, etc. Devemos a estas entidades nosso respeito, carinho, gratidão, amor, confiança e sobretudo nosso esforço para contribuir com o bom andamento dos trabalhos”.
* Refere-se à ação de desmanchar o ato de “obsedar”. “Obsedar = perseguir. É o trabalho de correntes atrasadas que leva os perseguidos às mais tremendas situações, inclusive loucura... O obsessor, consciente ou inconsciente estende sua maléfica atuação não somente sobre uma pessoa, mas diversas...Para se livrar, devem os perseguidos procurar um centro kardecista ou de Umbanda, respeitando o que for indicado pelos protetores”. Pinto, s/d.
**“Limpar a casa = praticar atos rituais de purificação para tirar do terreiro influências espirituais negativas” Cacciatore, 1988
16 Corrente de energia espiritual. 443
No binômio “atendimento e desenvolvimento” reside a base teórico-prática do grupo. Ou seja, na concepção de seus médiuns, não é possível praticar o primeiro junto ao consulentes que procuram o centro, sem uma ação sistemática no sentido de fortalecimento e aprofundamento espiritual, ou seja, o desenvolvimento. Assim, o grupo divide-se entre estes dois diferentes momentos de sua atuação.
O atendimento localiza-se entre os momentos mais importantes e mesmo a razão principal de ser da maioria dos centros, principalmente da Umbanda, que tem como um dos eixos centrais a prática da caridade. Entretanto, não se trata apenas de uma “doação” dos religiosos a seus consulentes, aqueles que procuram seus serviços espirituais. Trata-se de uma troca. As entidades aconselham, orientam e realimentam espiritualmente os médiuns, auxiliando até mesmo em dificuldades concretas da vida cotidiana, tais como problemas de saúde.
“Faço o desenvolvimento dos médiuns e depois eles escolhem qual a entidade que eles querem conversar. E conversam para resolver o problema. Porque a Umbanda basicamente resolve problemas: emocional, com filhos, profissionais, de relacionamentos e de saúde principalmente. Nós temos três entidades aqui que receitam muitos remédios, né? Minha família, se os médicos dependessem de nós morriam de fome [risos] porque raramente vamos ao médico.” (idem)
Estudo, pesquisa, observação e diálogo compõem a educação mediúnica. A preocupação da atividade de estudo e formação busca superar um certo praticismo espontaneísta identificado em outros grupos, que impede que o médium aprofunde conhecimentos e supere o nível da intuição e mediunidade espontâneas. O objetivo é que sua eficácia espiritual também aumente. Ou seja, há uma clara associação entre saber adquirido e mediunização e esta só pode ser plena e houver preocupação com a aquisição daquele.
“O que observo nos terreiros é que pegam a pessoa e dizem: ‘Tu bota uma roupa branca, compra uma guia de anjo-de-guarda’ e enfia o médium no terreiro, roda ele como se fosse um pião. O que acontece? O médium vai indo, indo, ouvindo daqui, dali. Ele não tem uma noção do porquê e do prá quê. Então, tem que educar esse médium. Ele tem que estudar, pesquisar, perguntar, muito, muito e sobretudo estar atento porque cada entidade que vem nos mostra tanta coisa, é só observar. Um médium ignorante não pode fazer muita coisa por ele e nem pelas pessoas que vem procurá-lo. Tem um ditado que diz: ‘Se o pote está sujo, a água não vai sair limpa. Ele tem que estudar” (idem)
São diversas as fontes informativas que podem auxiliar na formação de um médium. Elas podem ser orais ou escritas. Uma delas, citada pela mãe-de-santo Eldeni e a mais importante, segundo confirmação de vários entrevistados são as orientações emanadas das próprias entidades ou guias espirituais. Além da forma oral, através do diálogo com o médium este tipo de informação pode assumir ainda, como no caso da Tenda analisada, o formato de textos psicografados pela mãe-de-santo. O grupo possui também apostilas impressas e uma “agenda umbandista” elaboradas por seus participantes, que são utilizadas durante as sessões de estudo com informações sobre entidades do terreiro, horários dos trabalhos, textos de aconselhamento escritos pela mãe-de-santo ou retirados de alguma obra 444
publicada, lembretes sobre deveres do médium,17 credo e hino da Umbanda, calendário comemorativo dos orixás, prece para abertura dos trabalhos, pedido de proteção, banhos de descarga, etc.
Além disso, existem também as fontes religiosas clássicas, como o Evangelho, os textos empíricos e teóricos escritos por adeptos ou estudiosos das religiões afro-brasileiras e também a Internet. Há, portanto, uma combinação harmônica entre fontes escritas, orais e virtuais, oriundas do plano espiritual e material.
“O Evangelho é um só, com variações: o Kardecismo usa de um jeito, o catolicismo de outro, o evangélico de outro. Pegamos o Evangelho segundo o espiritismo, estudamos as questões da Umbanda. Os médiuns têm perguntas e durante os trabalhos não dá para responder. Então oriento: escreve pro dia do estudo a gente esclarecer. Utilizamos livros escritos sobre Umbanda. Não como manual prá ver como se faz um trabalho, isso de jeito nenhum! [risos] Que fique claro: ver como se faz oferenda para Ogun, não se consulta em livro! Nessas questões as próprias entidades nos orientam, respondem às questões de remédios, de porque fazer isso, não fazer, né? Usamos também pesquisa pela INTERNET.” (idem)
Dentro do trabalho formativo desenvolvido no grupo é objetivo primordial assimilar a diversidade de conhecimentos. A preocupação é conhecer as variadas linhas de pensamento dentro do grande campo dos autores que escreveram sobre as religiões afro-brasileiras. Entretanto, há uma insistência na imprescindibilidade da orientação oriunda do plano espiritual e da maior relevância desta no conjunto da atividade de estudo e pesquisa. Há também uma preocupação com a atualização, adaptação e evolução do conhecimento dos médiuns. Ou seja, não há uma concepção do saber como algo estático, parado no tempo, mas inserido num movimento que transforma continuamente seu conteúdo.
“Estudamos os fundamentos, como outros autores encaram a Umbanda: dependendo da descendência espiritual dele, ele tem uma visão. Tem aqueles que são pesquisadores, observam e dão o parecer. A gente lê prá ver o que estão dizendo...Porque uma coisa é o que a gente sente e pratica e outra é o que acaba passando para os outros. Tem que aprender, evoluir, se adaptar. Repito: não por exemplo, como se põe um filho na Umbanda, preparações que tem que fazer. Isso não se aprende em livro! Isso é a própria entidade que inicia os trabalhos espirituais dentro do terreiro quem ensina.” (idem)
Acoplada a esta concepção de construção do conhecimento como um processo dinâmico e plural, está a intenção de democratização do saber, aspecto bastante original da T.U. Cabocla Marola do Mar, exemplar entre o povo-de-santo local. Em grande parte dos terreiros, a mãe ou pai-de-santo abre e conduz as “giras”, as cerimônias rituais. Há
17 A título de ilustração: “No dia anterior ao trabalho, o médium não deve ter relações sexuais; ficar o mais calmo possível, mentalizando coisas boas, chamando pelos guias mentalmente; evitar bebidas alcoólicas e fumar; tomar banho de descarga antes da sessão; chegar 10 minutos antes do início, acender sua vela de anjo de guarda e fazer suas orações; procurar decorar os Pontos Cantados na Banda; estar atento aos trabalho e guias para aprender; auxiliar quando necessário; manter sua pasta de médium atualizada; estudar seu conteúdo e perguntar quando tiver dúvidas; providenciar o material necessário para seus guias: cigarros, bebidas, etc.; ser pontual e não faltar, manter a mensalidade em dia; manter bom relacionamento com irmãos de fé; evitar fofocas e conversas improdutivas” Agenda Umbandista, ABTUCMM, 1999 445
alguns raros casos nos quais, sendo a mãe ou pai-de-santo muito idosos, doentes ou estando limitados por razões diversas e possuindo um Pai ou Mãe Pequenos de extrema confiança, estes abrirão e conduzirão os trabalhos. Mas o que chama a atenção no caso aqui estudado é a explícita intenção da mãe-de-santo de romper esta obrigatoriedade e promover em seu terreiro a democratização do saber, através do revezamento de funções rituais que, em geral pertenceriam ao grau hierárquico mais alto no terreiro, mas que neste caso é exercido por outros médiuns, como forma de “práxis” de seu futuro religioso. Não há, de sua parte, qualquer limitação física ou espiritual que impeça a mãe-de-santo Eldeni de abrir e conduzir trabalhos; há apenas a vontade declarada de democratizar alguns papéis consolidados como exclusivos do chefe-de-terreiro, permitindo assim a autonomia do médium. O educador Paulo Freire já alertou para a importância da práxis no processo educativo, que promove a reflexão sobre a ação prática do indivíduo como alimentadora do processo de aquisição de saber. Parece ser esta a opção educativa da T.U. Cabocla Marola do Mar.
“Outra coisa que diferencia meu ritual dos outros, é que normalmente o pai-de-santo sempre abre os trabalhos. Eu não abro quase nunca. Os médiuns têm uma escala: quem abre os trabalhos, quem faz a limpeza...Quem abre os trabalhos, segue esse ritual [mostra um livro sobre o altar] que eu deixo. Está prontinho e... abre os trabalhos....Se estou preparando um médium para ser pai-de-santo ele só vai aprender fazendo! Não posso esconder isso, tenho que abrir” (idem)
Coerente com a opção da democracia interna e da divisão de responsabilidades, algumas noções “do santo” adquirem uma significação bastante específica. É o caso do “segredo” religioso e ritual. Para a mãe-de-santo Eldeni, o segredo limita-se aos conhecimentos específicos que resultam da combinação espiritual do médium e de seu lugar na escala hierárquica e que, por esta razão, não são aplicáveis a outro, o que justificaria porque não são coletivizados. Entretanto, acima do conhecimento transmitido pela mãe-de-santo está sempre a vontade do guia espiritual, que deve preponderar sobre qualquer outra determinação, como já vimos anteriormente.
“Esses segredos, ou seja, a magia da Umbanda, a gente só transmite para um médium quando ele se recolhe para se tornar pai ou mãe-de-santo. No retiro já se começa a passar os fundamentos secretos, ou melhor, não é secreto, é a essência – Fundamentos Essenciais – sempre obedecendo à descendência dele. Por exemplo: tenho um filho-de-santo que é pai-de-santo e filho de Ogun. Então, tenho que dar para ele os fundamentos de Ogun dizendo: ‘Consulta teu Pai de Cabeça18 e vê se é isto mesmo o que ele quer.’” (idem)
A democratização do conhecimento não significa, portanto, sua vulgarização ou banalização, mas desdobra-se em duas vertentes: além do mencionado acesso à ação prática ritual como forma de exercício preparatório no processo educativo, significa o fornecimento de ferramentas para aquele que já está preparado para determinado poder religioso a fim de que possa exercê-lo sem depender de outrem. A construção da autonomia
18 “Pai-de-cabeça = orixá masculino protetor principal de uma pessoa (homem). Tem como juntó* outro orixá feminino, a mãe. No caso de uma mulher é geralmente firmada a mãe-de-cabeça”. Cacciatore, 1988
* “Juntó = orixá auxiliar na proteção do orixá dono-da-cabeça sobre o filho. Segundo santo pessoal”. idem 446
significa, portanto, subsidiar o médium de acordo com a escala hierárquica religiosa em que se encontra e que lhe dá direito à obtenção das informações, juntamente com o conseqüente aumento da carga de responsabilidade material e espiritual.
“O básico eu fiz: fui lá e fiz a firmeza19 do terreiro dele, expliquei como tinha que ser e outras coisas que a gente só diz para um médium quando ele vai ser pai-de-santo, conscientizá-lo da responsabilidade. Isto não se fala para um médium que está iniciando porque ele acaba confundindo e fazendo tudo errado. É como na escola: ao jardim o que é do jardim; ao primeiro grau o que é primeiro grau. Assim é na religião, tem que ser aos poucos, porque chega na metade do caminho muitos desistem e esses conhecimentos não podem ficar com uma pessoa que não adquiriu a noção de responsabilidade e de como fazer uso deles. Senão a gente estaria fazendo um monte de aprendiz de feiticeiro por aí, não é? [risos]” (idem)
Se o segredo tem a medida da dimensão do conhecimento que cabe ao indivíduo conforme seu local na escala religiosa e sua descendência espiritual, não cabe, portanto, manipulação do conceito no sentido de utilizá-lo como subterfúgio ou meio de exercer a mistificação religiosa.
“Para mim, não tem esse negócio de segredo. Às vezes é desculpa porque a pessoa não sabe responder o que foi perguntado. O segredo mesmo é quando o médium se deita pro santo e recebe as mensagens do orixá. O chefe de terreiro fica só orientando. Por exemplo, nenhum dos meus médiuns sabe o que está enterrado aqui, mas não interessa, porque quando eles forem ter o terreiro deles, vão ser outras coisas enterradas, porque os santos são outros, as características de cada um varia. No mais, segredo não existe. Os ditos segredos são trabalhos que se faz para os mais variados fins.” (idem)
Pelo exposto, vimos que os terreiros das religiões afro-brasileiras na Grande Florianópolis apresentam um potencial significativo como verdadeiros centros educacionais de prática intercultural, de aprendizagem social, cultural, religiosa e política.
O exame das práticas, concepções e desafios da educac’~ao intercultural e Ambiental das religiões afro-brasleiras indica que o povo-de-santo da Grande Florianópolis, representa, além de uma importante amplitude social, uma extensiva organização espacial em forma de rede urbana que articula mensagens simbólicas e projetos comuns através de relações informais (Scherer-Warren, 1995). Esta teia humana, apesar de sua invisibilidade aparente na atualidade, possui uma expressiva presença social e histórica junto a seus integrantes e simpatizantes, articulando-se, ademais, pela instância da busca espiritual e essencial do ser humano no cosmos.
19 “Firmeza = o mesmo que segurança. Conjunto de objetos com força mística (axé) que, enterrados no chão protegem um terreiro e constituem sua base espiritual” . idem

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Aruê, Meu Povo!


Saravá Os Pretos Velhos!








13 de maioDia dePreto VelhoPretos-velhos são espíritos que se apresentam em corpo fluídico de velhos africanos que viveram nas senzalas, majoritariamente como escravos que morreram no tronco ou de velhice, e que adoram contar as histórias do tempo do cativeiro. Sábios, ternos e pacientes, dão o amor, a fé e a esperança aos "seus filhos".São entidades desencarnadas que tiveram pela sua idade avançada, o poder e o segredo de viver longamente através da sua sabedoria, apesar da rudeza do cativeiro demonstram fé para suportar as amarguras da vida, consequentemente são espíritos guias de elevada sabedoria geralmente ligados à Confraria da Estrela Azulada dentro da Doutrina Umbandista do Tríplice Caminho (AUMBANDHAM - alegria e pureza + fortaleza e atividade + sabedoria e humildade), trazendo esperança e quietude aos anseios da consulência que os procuram para amenizar suas dores, ligados a vibração de Omolu, são mandingueiros poderosos, com seu olhar prescrutador sentado em seu banquinho, fumando seu cachimbo, benzendo com seu ramo de arruda,rezando com seu terço e aspergindo sua água fluidificada, demandam contra o baixo astral e suas baforadas são para limpeza e harmonização das vibrações de seus médiuns e de consulentes. Muitas vezes se utilizam de outros benzimentos, como os utilizados pelo Pai José de Angola, que se utiliza de um preparado de "guiné" (pedaços de caule em infusão com cachaça) que coloca nas mãos dos consulentes e solicita que os mesmos passem na testa e nuca, enquanto fazem os seus pedidos mentalmente; utiliza-se também de vinho moscatel, com o que constantemente brinda com seus "filhos" em nome da vitória que está por vir.São os Mestres da sabedoria e da humildade. Através de suas várias experiências, em inúmeras vidas, entenderam que somente o Amor constrói e une a todos, que a matéria nos permite existir e vivenciar fatos e sensações, mas que a mesma não existe por si só, nós é que a criamos para estas experiências, e que a realidade é o espírito. Com humildade, apesar de imensa sabedoria, nos auxiliam nesta busca, com conselhos e vibrações de amor incondicional. Também são Mestres dos elementos da natureza, a qual utilizam em seus benzimentos.Os Pretos Velhos: Os espíritos da humildade, sabedoria e paciência.Os Pretos Velhos são entidades cultuadas pelas religiões afro-brasileiras, em especial a Umbanda. Nos trabalhos espirituais desta religião, os médiuns incorporam entidades que possuem níveis de evolução e arquétipos próprios. Estas se dividem em três níveis:As Crianças – chamadas eres, ou ibejis, representam a pureza, a inocência, daí sua característica infantil.Os Caboclos – onde se incluem os Boiadeiros, Caboclos e Caboclas, representam a força, a coragem, portanto apresentam a forma do adulto, do herói, do guerreiro, do índio ou soldado.Os Pretos Velhos – incluem os Tios e Tias, Pais e Mães, Avôs e Avós todos com a forma do idoso, do senhor de idade, do escravo. Sua forma idosa representa a sabedoria, o conhecimento, a fé. A sua característica de ex-escravo passa a simplicidade, a humildade, a benevolência e a crença no “poder maior”, no Divino.Casal de Pretos-VelhosA grande maioria dos terreiros de Umbanda, assim também suas entidades possuem a fé Cristã, ou seja, acreditam e cultuam Jesus (Oxalá). Entidades aqui tomada no sentido de espíritos que auxiliam aos encarnados, o mesmo que guia de luz.A característica desta linha seria o conselho, a orientação aos consulentes devido a elevação espiritual de tais entidades, são como psicólogos, receitam auxílios, remédios e tratamentos caseiros para os males do corpo e da alma.Os Pretos Velhos seriam as entidades mais conhecidas nacionalmente, mesmo por leigos que só ouviram falar destas religiões Afro-Brasileiras. O Preto Velho é lembrado também pelo instrumento que normalmente utiliza, o cachimbo.Os nomes de alguns Pretos Velhos comuns de que se tem notícia são Pai João, Pai Joaquim de Angola, Pai José de Angola, Pai Francisco, Vovó Maria Conga, Vovó Catarina. Pai Jacó[1], Pai Benedito[2], Pai Anastácio, Pai Jorge, Pai Luís, Mãe Maria, Mãe Cambina, Mãe Sete Serras, Mãe Cristina, Mãe Mariana, Maria Conga, Vovó Rita, dentre outros.Na Umbanda os Pretos Velhos são homenageados no dia 13 de maio, data que foi assinada a Lei Áurea, a abolição da escravatura no Brasil.Os pontos servem para saudar a presença das entidades, diferentemente do que geralmente se pensa, não foram feitos para chamar, mas sim para agradecer a presença, como um "Olá".Pontos de preto velho:Saudação dos Pretos Velhos quando iniciada uma giraBate tamborlá na Angola, bate tamborBate tamborlá na Angola, bate tambor...Bate tambor, Pai Joaquim*...Bate tambor, Maria Conga*...Bate tambor, Pai Mané*...(* coloca-se o nome dos pretos velhos da casa)Eu andava perambulando,sem ter nada p'ra comerFui pedir as Santas AlmasPara vir me socorrerFoi as Almas que me ajudouFoi as almas que me ajudouMeu Divino Espírito SantoGlória Deus, Nosso SenhorNessa casatem quatro cantosCada canto tem um santoPai e filho, Espírito SantoNessa casa tem 4 cantos...Quem vem, que vem lá de tão longe?São os pretos velhos que vem trabalharQuem vem, que vem lá de tão longe?São os pretos velhos que vem trabalharÔ da-me forças pelo amor de Deus, meu paiÔ da-me forças pros trabalhos teusZum zum zumOlha só Jesus quem éEu rezo para santas almasInimigo caiEu fico de péO preto por ser pretoNão merece ingratidãoO preto fica brancoNa outra encarnaçãoNo tempo da escravidãoComo o senhor me batiaEu chamava por Nossa Senhora, Meu Deus!Como as pancadas doíamTira o cipó do caminho,oi criançaDeixa a vovó atravessarTira o cipó do caminho,oi criançaDeixa a vovó atravessarA bença VovôQuando precisar lhe chamoA bença VovôQuando precisar lhe chamoZambi lhe trouxe, Zambi vai lhe levarAgradeço a toalha de renda de chita de pai OxaláVovô já vai, já vai pra Aruanda...Abença meu pai, proteção pra nossa bandaPontos de Pretos Velhos:Negro está molhado de suor, mas tá feliz porque Deus o libertou (bis);Ô sinhá sinha, segura a chibata não deixa bater, faz uma prece prá negro morrer, negro não quer mais sofrer (bis);Ponto p/firmar a gira: Viva Deus, viva a Gloria, viva o rosário de nossa Senhora (bis);Ponto para benzimentos: Pai João d"angola com sua ternura, sentado no tronco ele benze as criaturas(bis), a estrela de Oxalá seu ponto iluminou, ele é Pai João d"angola ele é nosso protetor;Ponto de subida de pretos velhos: Já vai pretos velhos subindo pro céu e nossa senhora cobrindo com véu (bis).A linha de Preto Velho, na Umbanda, são entidades que se apresentam estereotipados como anciãos negros conhecedores profundos da magia Divina e manipulação de ervas, o qual aplicam frequentemente em sua atuação na Umbanda, porém no Candomblé são considerados Eguns.Crê-se que em referência à dor e aflição sofrida pelo povo negro (período de trevas no território brasileiro), a linha de preto velho reflete a humildade, a paciência e a perseverança característica da atuação da linha nominada de Yorima, cujo apresenta-se de pés no chão, cachimbo de barro bem rústico, quando não cigarro de palha, café, e um fio de contas de rosários (Lágrima de Nossa Senhora) e cruzes, figas e breves os quais utilizam magisticamente em sua atuação astral.Os pretos velhos apresentam-se com nomes de individualizam sua atuação, conforme nação ou orixá regente, evidenciando sua atuação propriamente dita.Os nomes comumente usados são:* Pai Joaquim;* Pai Francisco;* Pai Maneco;* Pai João;* Pai José;* Pai Mané;* Pai Antônio;* Pai Roberto;* Pai Cipriano;* Pai Tomaz;* Pai Jobim;* Pai Roberto;* Pai Guiné;* Pai Jacó;* Pai Benedito;* Velho Liberatoetc...ou femininos:* Vó Cambinda;* Vó Cecília;* Vó Maria Conga;* Vó Catarina;* Vó Ana;* Vó Quitéria;* Vó Benedita;* Vó Cambinda;etc...Em sua linha de atuação eles apresentam-se pelos seguintes codinomes, conforme acontecia na época da escravidão, onde os negros eram nominados de acordo com a região de onde vieram:* Congo_ Ex: (Pai Francisco do Congo), refere-se a pretos velhos ativos na linha de Iansã;* Aruanda_ Ex: (Pai Francisco de Aruanda), refere-se a pretos velhos ativos na linha de Oxalá. (OBS: Aruanda quer dizer céu);* D´Angola_ Ex: (Pai Francisco D´Angola), refere-se a pretos velhos ativos na linha de Ogum;* Matas_ Ex: (Pai Francisco das Matas), refere-se a pretos velhos ativos na linha de Oxóssi;* Calunga, Cemitério ou das Almas_ Ex: (Pai Francisco da Calunga, Pai Francisco do Cemitério ou Pai Francisco das Almas), refere-se a pretos velhos ativos na linha de Omolu/ Obaluayê;Entre diversas outras nominações tais como: _Guiné, Moçambique, da Serra, da Bahia, etc...Muitos Pretos Velhos podem apresentar-se como Tio, Tia, Pai, Mãe, Vó ou Vô, porém todos são Pretos Velhos. Na gira eles só comem o que for feito de milho como por exemplo:* Bolo de milho, pamonha, cural e etc."AS SETE LÁGRIMAS DE UM PRETO VELHO".Num cantinho de um terreiro, sentado num banquinho, fumando o seu cachimbo um triste Preto Velho chorava. De seus olhos molhados, esquisitas lágrimas desciam-lhe pela face e... Foram sete.A Primeira... A estes indiferentes que vem no Terreiro em busca de distração, para saírem ironizando aquilo que suas mentes ofuscadas não podem conceber;A Segunda... A esses eternos duvidosos que acreditam, desacreditando, na expectativa de um milagre que os façam alcançar aquilo que seus próprios merecimentos negam;A Terceira... Aos maus, aqueles que somente procuram a umbanda em busca de vingança, desejando sempre prejudicar ao semelhante;A Quarta... Aos frios e calculistas, que sabem que existe uma força espiritual e procuram beneficiar-se dela de qualquer forma, e não conhecem a palavra gratidão;A Quinta... Chega suave, tem o sorriso, o elogio da flor dos lábios, mas se olharem bem seu semblantes verão escrito: creio na Umbanda, nos teus Caboclos e no teu Zambi, mas somente se resolverem o meu caso ou me curarem disto ou daquilo;A Sexta... Aos fúteis, que vão de centro em centro, não acreditando em nada, buscam aconchego, conchavos e seus olhos revelam um interesse diferente;A Sétima... Como foi grande e como deslizou pesada! Foi à última lágrima, aquela que vive nos olhos de todos os Orixás. Aos médiuns vaidosos (as), que só aparecem no Centro em dia de festa e faltam as doutrinas. Esquecem que existem tantos irmãos precisando de caridade e tantas criancinhas precisando de amparo material e espiritual.* As Sete Lágrimas De Um Preto VelhoPretos-Velhos De OxumSão mais lentos na forma de incorporar e até falar. Passam para o médium uma serenidade inconfundível. Não são tão diretos para falar, enfeitam o máximo a conversa para que uma verdade dolorosa possa ser escutada de forma mais amena, pois a finalidade não é “chocar” e sim, fazer com que a pessoa reflita sobre o assunto que está sendo falado.São especialistas em reflexão, nunca se sai de uma consulta de um Preto-Velho de Oxum sem um minuto que seja de pensamento interior. Às vezes é comum sair até mais confuso do que quando entrou, mas é necessário para a evolução daquela pessoa.

Cláudia Rinvenuto

quinta-feira, 6 de maio de 2010

As lições do “axé”

As lições do “axé”[1]:

a pedagogia intercultural e comunitária nas religiões afro-brasileiras


Profa. Dra. Cristiana Tramonte

* Professora do Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Catarina; Mestre em Educação e Doutora em Ciências Humanas pela UFSC.


Resumo

Sob o prisma da Intercultura, as práticas das religiões afro-brasileiras apresentam-se como um campo híbrido de construção de identidade no qual emergem novas estratégias de organização que apontam novas perspectivas para a educação intercultural.
As religiões afro-brasileiras, cujo comando cultural pertence à população negra, congregam a diversidade das origens étnicas e culturais do país, consolidando-se como signos de “brasilidade”. O artigo aqui proposto visa a apresentar a experiência educativa comunitária e intercultural de dois grupos, dois “terreiros” de prática religiosa, completando assim, um ciclo de significações que tenta compreender a problemática do ponto de vista de sua complexidade e da integralidade quando tratamos dos sujeitos destas vivências.

Introdução

Sob o prisma da Intercultura, as práticas das religiões afro-brasileiras apresentam-se como um campo híbrido de construção de identidade no qual emergem novas estratégias de organização que apontam novas perspectivas para a educação intercultural.
As religiões afro-brasileiras, cujo comando cultural pertence à população negra, congregam a diversidade das origens étnicas e culturais do país, consolidando-se como signos de “brasilidade”. O artigo aqui proposto visa a apresentar a experiência educativa comunitária e intercultural de dois grupos, dois “terreiros” de prática religiosa, completando assim, um ciclo de significações que tenta compreender a problemática do ponto de vista de sua complexidade e da integralidade quando tratamos dos sujeitos destas vivências.
Essa multiplicidade de inter-influências produz um campo eminentemente educativo no qual os desdobramentos não são unívocos, mas múltiplos e complexos; é esta relação que produz o campo intercultural.
Entende-se Intercultura conforme a define Giacalone (1998): esta colocada a relação intercultural quando as diferentes dimensões entram em relação, “colocam-se em jogo”: “Se a multiculturalidade pode ser a convivência ...entre grupos distintos, a intercultura é a possibilidade de um projeto, de uma troca, na qual existe a reciprocidade de olhares e de intenções, na qual se dá o confronto entre identidade/diferença”.
Este é um universo de significados de extrema relevância se tomarmos em consideração os fanatismos e extremismos de toda ordem que surgem e ressurgem nesta virada de milênio.
Nas relações endógenas dos grupos religiosos afro-brasileiros, analisaremos especificamente o trabalho de formação e desenvolvimento mediúnico desenvolvido pela Tenda de Umbanda Cabocla Marola do Mar.
Em suas relações exógenas, procuramos desvendar o trabalho educativo intercultural comunitário desenvolvido pela Tenda Espírita Caboclo Cobra Verde.

O trabalho de formação e desenvolvimento mediúnico: o caso da Tenda de Umbanda Cabocla Marola do Mar

Vários centros religiosos desenvolvem, junto a seus médiuns, um trabalho de formação e desenvolvimento, que caracteriza uma ação intercultural em seu sentido mais amplo. Segundo Fleuri (1999) “na atividade formativa ressaltam-se as formas e conteúdos da cultura interiorizada pelos indivíduos na vida cotidiana, a variedade ...das experiências com que estabelecem contato...” É nesta perspectiva que analisaremos o trabalho desenvolvido pela T.U. Cabocla Marola do Mar pela excelente sistematização do trabalho, confecção de material pedagógico e pelo lugar central que a preocupação educativa ocupa no grupo como um todo. A atividade de estudo e pesquisa da Tenda atua como um suporte das ações de atendimento e desenvolvimento.
A Associação Beneficente Tenda de Umbanda Cabocla Marola do Mar é uma sociedade civil, pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, de caráter cultural, educacional, social e filantrópico “voltado especialmente para o estudo e difusão da cultura afro-brasileira”[2]. A mãe-de-santo (ou chefe-de-terrreiro) responsável é Eldeni Fernandes Camargo.
Entre seus objetivos estão o estudo, prática e divulgação da cultura afro-brasileira, a prática da caridade como dever social e princípio de moral e como exercício pleno de solidariedade e respeito ao ser humano. Além disso, promove o desenvolvimento de trabalhos educacional, esportivo, social e de defesa e benefício da comunidade na qual a Tenda se insere. Embora a Tenda pratique, de fato, os dois últimos aspectos citados, nos deteremos no primeiro, aquele que diz respeito diretamente à compreensão e prática religiosas, inseridas num contexto macro de cultura afro-brasileira.
A organização institucional segue a configuração tradicional: presidente de honra, presidente e vice-presidente, primeiro e segundo secretários, primeiro e segundo tesoureiros e diretores de departamentos.
A organização religiosa é formada por um conjunto formado pelos guias espirituais[3], médiuns e pela chefe de terreiro Mãe Eldeni, filha de Iemanjá e Ogun e entidades, tendo como guia de frente[4] a Cabocla Marola do Mar e Omolocô Caboclo Lírio Branco (coordena todos os trabalhos realizados na tenda, sob orientação da primeira)[5]
Eldeni exemplifica como se dá o acolhimento e definição das funções dos médiuns e suas entidades, em um auto-aprendizado coletivo das “linhas” que vão se agregando e num processo de contínua transformação, totalmente aberto à inclusão de novas contribuições espirituais e coerente com a opção democrática preponderante neste centro.

“A Cecília começou como cambona, e depois veio o Omolu. A Milena tem o Povo do Oriente. Ela veio e ensinou a todos como era. Se chegar outras entidades (marinheiro, baiano), a gente vai incluindo”.

O cronograma dos trabalhos inclui o revezamento das sessões destinadas às entidades com os períodos de estudo, atendimento e desenvolvimento, assim descritos pela mãe-de-santo.

“Segunda é atendimento: médiuns e entidades se revezam. Esses que estão começando não dão atendimento, ficam só na corrente[6]; na quinta, é desenvolvimento: cada um chama suas entidades para atender os médiuns. Quando o médium começa, perde muito o equilíbrio. No desenvolvimento ele vai se concentrando mais, se firmando... pode se exercitar...então, não é para o público, é só para os médiuns porque eles também querem conversar com os guias que incorporam aqui.”

No binômio “atendimento e desenvolvimento” reside a base teórico-prática do grupo. Ou seja, na concepção de seus médiuns, não é possível praticar o primeiro junto ao consulentes que procuram o centro, sem uma ação sistemática no sentido de fortalecimento e aprofundamento espiritual, ou seja, o desenvolvimento. Assim, o grupo divide-se entre estes dois diferentes momentos de sua atuação.
O atendimento localiza-se entre os momentos mais importantes e mesmo a razão principal de ser da maioria dos centros, principalmente da Umbanda, que tem como um dos eixos centrais a prática da caridade. Entretanto, não se trata apenas de uma “doação” dos religiosos a seus consulentes, aqueles que procuram seus serviços espirituais. Trata-se de uma troca. As entidades aconselham, orientam e realimentam espiritualmente os médiuns, auxiliando até mesmo em dificuldades concretas da vida cotidiana, tais como problemas de saúde.

“Faço o desenvolvimento dos médiuns e depois eles escolhem qual a entidade que eles querem conversar. E conversam para resolver o problema. Porque a Umbanda basicamente resolve problemas: emocional, com filhos, profissionais, de relacionamentos e de saúde principalmente. Nós temos três entidades aqui que receitam muitos remédios, né? Minha família, se os médicos dependessem de nós morriam de fome [risos] porque raramente vamos ao médico.” (idem)

Estudo, pesquisa, observação e diálogo compõem a educação mediúnica. A preocupação da atividade de estudo e formação busca superar um certo praticismo espontaneísta identificado em outros grupos, que impede que o médium aprofunde conhecimentos e supere o nível da intuição e mediunidade espontâneas. O objetivo é que sua eficácia espiritual também aumente. Ou seja, há uma clara associação entre saber adquirido e mediunização e esta só pode ser plena e houver preocupação com a aquisição daquele.

“O que observo nos terreiros é que pegam a pessoa e dizem: ‘Tu bota uma roupa branca, compra uma guia de anjo-de-guarda’ e enfia o médium no terreiro, roda ele como se fosse um pião. O que acontece? O médium vai indo, indo, ouvindo daqui, dali. Ele não tem uma noção do porquê e do prá quê. Então, tem que educar esse médium. Ele tem que estudar, pesquisar, perguntar, muito, muito e sobretudo estar atento porque cada entidade que vem nos mostra tanta coisa, é só observar. Um médium ignorante não pode fazer muita coisa por ele e nem pelas pessoas que vem procurá-lo. Tem um ditado que diz: ‘Se o pote está sujo, a água não vai sair limpa. Ele tem que estudar” (idem)

São diversas as fontes informativas que podem auxiliar na formação de um médium. Elas podem ser orais ou escritas. Uma delas, citada pela mãe-de-santo Eldeni e a mais importante, segundo confirmação de vários entrevistados são as orientações emanadas das próprias entidades ou guias espirituais. Além da forma oral, através do diálogo com o médium este tipo de informação pode assumir ainda, como no caso da Tenda analisada, o formato de textos psicografados pela mãe-de-santo. O grupo possui também apostilas impressas e uma “agenda umbandista” elaboradas por seus participantes, que são utilizadas durante as sessões de estudo com informações sobre entidades do terreiro, horários dos trabalhos, textos de aconselhamento escritos pela mãe-de-santo ou retirados de alguma obra publicada, lembretes sobre deveres do médium,[7] credo e hino da Umbanda, calendário comemorativo dos orixás, prece para abertura dos trabalhos, pedido de proteção, banhos de descarga, etc.
Além disso, existem também as fontes religiosas clássicas, como o Evangelho, os textos empíricos e teóricos escritos por adeptos ou estudiosos das religiões afro-brasileiras e também a Internet. Há, portanto, uma combinação harmônica entre fontes escritas, orais e virtuais, oriundas do plano espiritual e material.

“O Evangelho é um só, com variações: o Kardecismo usa de um jeito, o catolicismo de outro, o evangélico de outro. Pegamos o Evangelho segundo o espiritismo, estudamos as questões da Umbanda. Os médiuns têm perguntas e durante os trabalhos não dá para responder. Então oriento: escreve pro dia do estudo a gente esclarecer. Utilizamos livros escritos sobre Umbanda. Não como manual prá ver como se faz um trabalho, isso de jeito nenhum! [risos] Que fique claro: ver como se faz oferenda para Ogun, não se consulta em livro! Nessas questões as próprias entidades nos orientam, respondem às questões de remédios, de porque fazer isso, não fazer, né? Usamos também pesquisa pela INTERNET.” (idem)

Dentro do trabalho formativo desenvolvido no grupo é objetivo primordial assimilar a diversidade de conhecimentos. A preocupação é conhecer as variadas linhas de pensamento dentro do grande campo dos autores que escreveram sobre as religiões afro-brasileiras. Entretanto, há uma insistência na imprescindibilidade da orientação oriunda do plano espiritual e da maior relevância desta no conjunto da atividade de estudo e pesquisa. Há também uma preocupação com a atualização, adaptação e evolução do conhecimento dos médiuns. Ou seja, não há uma concepção do saber como algo estático, parado no tempo, mas inserido num movimento que transforma continuamente seu conteúdo.

“Estudamos os fundamentos, como outros autores encaram a Umbanda: dependendo da descendência espiritual dele, ele tem uma visão. Tem aqueles que são pesquisadores, observam e dão o parecer. A gente lê prá ver o que estão dizendo...Porque uma coisa é o que a gente sente e pratica e outra é o que acaba passando para os outros. Tem que aprender, evoluir, se adaptar. Repito: não por exemplo, como se põe um filho na Umbanda, preparações que tem que fazer. Isso não se aprende em livro! Isso é a própria entidade que inicia os trabalhos espirituais dentro do terreiro quem ensina.” (idem)

Acoplada a esta concepção de construção do conhecimento como um processo dinâmico e plural, está a intenção de democratização do saber, aspecto bastante original da T.U. Cabocla Marola do Mar, exemplar entre o povo-de-santo local. Em grande parte dos terreiros, a mãe ou pai-de-santo abre e conduz as “giras”, as cerimônias rituais. Há alguns raros casos nos quais, sendo a mãe ou pai-de-santo muito idosos, doentes ou estando limitados por razões diversas e possuindo um Pai ou Mãe Pequenos de extrema confiança, estes abrirão e conduzirão os trabalhos. Mas o que chama a atenção no caso aqui estudado é a explícita intenção da mãe-de-santo de romper esta obrigatoriedade e promover em seu terreiro a democratização do saber, através do revezamento de funções rituais que, em geral pertenceriam ao grau hierárquico mais alto no terreiro, mas que neste caso é exercido por outros médiuns, como forma de “práxis” de seu futuro religioso. Não há, de sua parte, qualquer limitação física ou espiritual que impeça a mãe-de-santo Eldeni de abrir e conduzir trabalhos; há apenas a vontade declarada de democratizar alguns papéis consolidados como exclusivos do chefe-de-terreiro, permitindo assim a autonomia do médium. O educador Paulo Freire já alertou para a importância da práxis no processo educativo, que promove a reflexão sobre a ação prática do indivíduo como alimentadora do processo de aquisição de saber. Parece ser esta a opção educativa da T.U. Cabocla Marola do Mar.

“Outra coisa que diferencia meu ritual dos outros, é que normalmente o pai-de-santo sempre abre os trabalhos. Eu não abro quase nunca. Os médiuns têm uma escala: quem abre os trabalhos, quem faz a limpeza...Quem abre os trabalhos, segue esse ritual [mostra um livro sobre o altar] que eu deixo. Está prontinho e... abre os trabalhos....Se estou preparando um médium para ser pai-de-santo ele só vai aprender fazendo! Não posso esconder isso, tenho que abrir” (idem)

Coerente com a opção da democracia interna e da divisão de responsabilidades, algumas noções “do santo” adquirem uma significação bastante específica. É o caso do “segredo” religioso e ritual. Para a mãe-de-santo Eldeni, o segredo limita-se aos conhecimentos específicos que resultam da combinação espiritual do médium e de seu lugar na escala hierárquica e que, por esta razão, não são aplicáveis a outro, o que justificaria porque não são coletivizados. Entretanto, acima do conhecimento transmitido pela mãe-de-santo está sempre a vontade do guia espiritual, que deve preponderar sobre qualquer outra determinação, como já vimos anteriormente.

“Esses segredos, ou seja, a magia da Umbanda, a gente só transmite para um médium quando ele se recolhe para se tornar pai ou mãe-de-santo. No retiro já se começa a passar os fundamentos secretos, ou melhor, não é secreto, é a essência – Fundamentos Essenciais – sempre obedecendo à descendência dele. Por exemplo: tenho um filho-de-santo que é pai-de-santo e filho de Ogun. Então, tenho que dar para ele os fundamentos de Ogun dizendo: ‘Consulta teu Pai de Cabeça[8] e vê se é isto mesmo o que ele quer.’” (idem)

A democratização do conhecimento não significa, portanto, sua vulgarização ou banalização, mas desdobra-se em duas vertentes: além do mencionado acesso à ação prática ritual como forma de exercício preparatório no processo educativo, significa o fornecimento de ferramentas para aquele que já está preparado para determinado poder religioso a fim de que possa exercê-lo sem depender de outrem. A construção da autonomia significa, portanto, subsidiar o médium de acordo com a escala hierárquica religiosa em que se encontra e que lhe dá direito à obtenção das informações, juntamente com o conseqüente aumento da carga de responsabilidade material e espiritual.

“O básico eu fiz: fui lá e fiz a firmeza[9] do terreiro dele, expliquei como tinha que ser e outras coisas que a gente só diz para um médium quando ele vai ser pai-de-santo, conscientizá-lo da responsabilidade. Isto não se fala para um médium que está iniciando porque ele acaba confundindo e fazendo tudo errado. É como na escola: ao jardim o que é do jardim; ao primeiro grau o que é primeiro grau. Assim é na religião, tem que ser aos poucos, porque chega na metade do caminho muitos desistem e esses conhecimentos não podem ficar com uma pessoa que não adquiriu a noção de responsabilidade e de como fazer uso deles. Senão a gente estaria fazendo um monte de aprendiz de feiticeiro por aí, não é? [risos]” (idem)

Se o segredo tem a medida da dimensão do conhecimento que cabe ao indivíduo conforme seu local na escala religiosa e sua descendência espiritual, não cabe, portanto, manipulação do conceito no sentido de utilizá-lo como subterfúgio ou meio de exercer a mistificação religiosa.

“Para mim, não tem esse negócio de segredo. Às vezes é desculpa porque a pessoa não sabe responder o que foi perguntado. O segredo mesmo é quando o médium se deita pro santo e recebe as mensagens do orixá. O chefe de terreiro fica só orientando. Por exemplo, nenhum dos meus médiuns sabe o que está enterrado aqui, mas não interessa, porque quando eles forem ter o terreiro deles, vão ser outras coisas enterradas, porque os santos são outros, as características de cada um varia. No mais, segredo não existe. Os ditos segredos são trabalhos que se faz para os mais variados fins.” (idem)

Pelo exposto, vimos que os terreiros das religiões afro-brasileiras na Grande Florianópolis apresentam um potencial significativo como verdadeiros centros educacionais de prática intercultural, de aprendizagem social, cultural, religiosa e política.



O trabalho educativo intercultural comunitário comunitário: o caso da Tenda Espírita Caboclo Cobra Verde

Giacalone (1998) aborda a intercultura como um projeto que busca conjugar universalismo e relavitismo, .... “colocar-se na relação, no confronto rela que podemos descobrir semelhanças e diferenças, o eu, o outro experimentando uma nova possibilidade de se tornar nós”. É dentro desta possibilidade de tornar-se “nós”, em uma perspectiva coletivista e comunitária, permeado pelo amálgama cultural da religiosidade, que analisaremos a T.E. Caboclo Cobra Verde. O grupo segue o ritual Almas e Angola e, “vem trabalhando em prol do desenvolvimento prático-mediúnico, colocando à disposição da comunidade um quadro de médiuns aptos a atender mediunicamente todas as pessoas que precisarem de apoio e orientação espiritual”[10]. Além disso, oferece aos seus médiuns o atendimento individual, e “este é realizado nas 24 horas que o médium necessitar”.
Além do atendimento espiritual àqueles que a procuram, a Tenda tem como objetivos auxiliar no suprimento, na medida do possível, de “necessidades mais imediatas” tais como: alimentação, roupas, etc. Segundo seus dirigentes, “seus trabalhos filantrópicos vão além dos ideais de solidariedade, buscando também a ação de cidadania e resgate à dignidade humana”. Na TECCV “a caridade é uma meta a ser seguida e para onde se direcionam suas atenções”.
Em sua organização institucional a TECCV conta com uma equipe de 30 pessoas entre médiuns e colaboradores diretos. A presidente é a Yalorixá Maria Tereza Bonete Martins. Além da Tenda, que responsabiliza-se pelo aspecto espiritual, a partir de 1999 foi criada, articulada a esta, a Associação Cobra Verde de Ação Solidária – ASCOVE, destinada exclusivamente à questão filantrópica.
Em caso de camarinha, há uma escala da organização dos médiuns na semana preparatória da “saída” dos que estão “recolhidos”: os trabalhos são realizados de segunda-feira a Domingo. Os turnos são escalonados nos períodos da manhã, tarde e noite, ininterruptamente, havendo a troca apenas de equipes de médiuns de um turno para outro.
O trabalho educativo intercultural comunitário desenvolvido pela TECCV desde sua fundação em 1988 foi assumido, a partir de 1999, pela entidade civil ASCOVE. Alguns integrantes participam de ambas as instâncias: a espiritual, sob responsabilidade da Tenda, e a assistencial, desenvolvida pela Associação. Não há, segundo seus dirigentes, qualquer obrigatoriedade desta dupla ação: há liberdade para optar somente pelo envolvimento espiritual ou somente assistencial. Há independência entre as duas instâncias.
O trabalho mais sistemático desenvolvido pela Associação atualmente ocorre basicamente junto à Comunidade do Pedregal, bairro Bela Vista, da qual são cadastradas as famílias mais necessitadas. Este contato ocorreu por iniciativa dos médiuns da Tenda, como um prolongamento do trabalho mediúnico, dentro da concepção de que a caridade não pode restringir-se ao plano espiritual, mas estender-se ao social. Note-se, pela descrição que o babalorixá Geovani faz das motivações iniciais, que não há uma visão unilateral de apenas “auxiliar a comunidade”, mas também a busca de um aprendizado dos próprios religiosos no sentido de realização plena de sua espiritualidade:

“Sentimos necessidade de ter contato mais direto com a comunidade. A gente tinha uma visão muito limitada da situação; procuramos a comunidade até para desenvolver a mediunidade, porque ser médium é assistir as pessoas de todas as formas. Não só espiritual mas, às vezes, até material, dependendo da situação. O médium é um porta-voz, é um mensageiro espiritual”.

Apesar da independência entre as instâncias mediúnicas e filantrópicas, há entre estas um ponto de intersecção fundamental: a entidade mentora da Tenda, o Caboclo Cobra Verde, que determina os caminhos espirituais e assistenciais. Entre as estratégias orientadas por ele, está a de envolvimento da comunidade de classe social mais abonada que habita em torno da Tenda na arrecadação dos donativos para os mais pobres. Esta mostrou-se eficiente enquanto solucionadora das dificuldades materiais que a proposta de filantropia enfrentou em seu início:

“ A primeira atividade começou em 89: doação de roupas, alimentos e brinquedos. Na primeira campanha começamos atendendo às crianças com brinquedos usados porque o grupo não tinha dinheiro para novos. A própria entidade nos orientou naquele caminho, mobilizar mais pessoas para a caridade. Hoje mobilizamos toda a comunidade para donativos e todos os vizinhos próximos vêm nos procurar para ver como podem colaborar na Campanha”. (Babalorixá Geovani)

O trabalho comunitário educativo urge como uma estratégia contra o preconceito e pela integração da Tenda com a comunidade circundante e será o principal veículo de rompimento dos estigmas em relação à prática religiosa. O trabalho educativo intercultural, tanto junto à comunidade pobre, quanto junto à mais abonada, circunvizinha à Tenda, representou a ponte concreta de diálogo entre os planos espiritual e material, na medida em que possibilitou a abertura desta vizinhança à aceitação da diversidade religiosa e superação de preconceitos.

“Quando a gente construiu esse espaço, há onze anos, sofríamos preconceito dos vizinhos, eles criticavam. As casas são muito próximas, o barulho atrapalhava e, por não conhecerem, tinham uma visão negativa da Umbanda, imaginam coisas que não é realidade. Com esse trabalho assistencial, conseguimos mobilizar e mostrar para a comunidade que o que a gente faz é positivo, tanto no sentido espiritual quanto no sentido de atendimento às comunidades...Passaram a nos ver com outros olhos. E começaram a se aproximar.” (Babalorixá Geovani)

Como resultado de dez anos de atuação, o trabalho educativo intercultural comunitário da TECCV possibilitou a saída dos médiuns para além do espaço exclusivo da Tenda e arredores, além de conseguir outros apoios, ampliando sua ação e seu leque de influência:

“A gente não está mais fazendo a festa na Tenda, porque se tornou pequeno. Agora a Festa dos Carentes é no Ginásio de Esportes da Bela Vista. O pessoal do ginásio sabe que é do pessoal da Umbanda e apoia, mas porque é o nosso centro e já conhecem nosso trabalho”. (Babalorixá Geovani)

Atualmente, um nova etapa está sendo planejada pelos integrantes da TECCV e ASCOVE: a realização de cursos profissionalizantes junto à comunidade do Morro do Pedregal. O objetivo é um trabalho de formação com vistas à construção da autonomia e rompimento da dependência:

“Não adianta só dar o peixe, tem que ensinar a pescar. Isso foi orientado pelos mentores do terreiro”. (Babalorixá Geovani)

Pelo exposto, pode-se afirmar que a T.E. Caboclo Cobra Verde está atuando como um verdadeiro centro de formação e educação, com uma concepção que alia espiritualidade e solidariedade na prática. Sua ação transforma não somente o grupo de médiuns, mas irradia-se à toda a comunidade circundante. Em seu trajeto, vai transformando preconceitos em espírito participativo e desejo de colaboração.
Além deste trabalho mais sistemático desenvolvido pela Tenda, os centros realizam esporadicamente algumas ações comunitárias. Por exemplo, nas ocasiões festivas de homenagens aos orixás, geralmente há um momento de confraternização ao final do ritual, quando alimentos são servidos ou distribuídos a todos que desejem participar, quer sejam freqüentadores do terreiro ou não, uma prática generalizada entre o povo-de-santo.
A Tenda de Umbanda Cabocla Marola do Mar, de Mãe Eldeni está projetando, através da Associação Beneficente e Cultural Marola do Mar, uma sede ampliada na qual instalará um centro assistencial. Neste, além das sessões de Umbanda e estudo do Evangelho, haverá um depósito de donativos angariados para a população carente, sala de aula para reforço pedagógico e alfabetização de adultos e espaço para creche abrigando crianças de 0 a 6 anos em período integral[11].
O trabalho comunitário educativo é encarado como oportunidade de crescimento espiritual para os médiuns e como estratégia contra o preconceito e integração, pela sua ação intercultural e social. As divindades determinam os caminhos religiosos e assistenciais, imbricando-os. A meta é a autonomia da comunidade, com o terreiro atuando como centro de formação e educação comunitária e intercultural, percorrendo, como assinala Fleuri (1999) “os complexos itinerários de formação e produção cultural em contextos já fortemente miscigenados”, como é o caso do Brasil. A educação intercultural pode, neste sentido, auxiliar na promoção dos sujeitos que muitas vezes estão à margem dos processos de visibilidade social e cidadania. Neste sentido, pode recuperar a centralidade da contribuição dos grupos citados para a equidade, tolerância e convivência democráticas em nossos país, aliando espiritualidade e solidariedade na prática, cuja ação intercultural transforma o grupo internamente e a sociedade envolvente.

Bibliografia

· BASTIDE, Roger. As religiões africanas no Brasil. SP: Liv. Pioneira Editora, 1985.
· CACCIATORE, Olga Gudolle. Dicionário de Cultos afro-brasileiros. RJ: Forense Universitária, 1988.
· GEERTZ, Clifford. Cap.IV: A Religião como Sistema Cultural. In: GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Pg.101– 142.
· Fleuri, Reinaldo Matias. Educação Intercultural e complexidade: implicações epistemológicas e perspectivas pedagógicas da educação intercultural no Brasil. Relatório do Projeto. Mover: UFSC, 1999
· GIACALONE, Fiorella. La festa, il Cibo, L’Incontro. Strumenti di lettura della Festa per un’educazione interculturale.Arnaud: Firenze; CIDIS:Perugia, 1998
· MORIN, Edgar.Complexidade e ética da solidariedade”. in Ensaios de Complexidade. Porto Alegre: Sulina, 1997.
· ORTIZ, Renato. A morte branca do feiticeiro negro. Petrópolis: Vozes, 1978.
· SODRÉ, Nelson Werneck. Síntese da História da Cultura Brasileira. São Paulo: Difel, 1985.
· TRAMONTE, Cristiana. Com a bandeira de Oxalá! Trajetória, práticas e concepções das religiões afro-brasileiras na Grande Florianópolis. Lunardelli, Editora da UNIVALI, Florianópolis, 2001
· TRATADO contra o Racismo. In: Tratados das ONGs. Aprovados no Fórum Internacional de Organizações Não-Governamentais e Movimentos Sociais no âmbito do Fórum Global Eco-92. Rio de Janeiro: RJ, Instituto de Ecologia e Desenvolvimento, [s/d}. 264p.

[1] “Força dinâmica das divindades, poder de realização...” CACCIATORE, 1988
[2] Estatuto social. Associação Beneficente Tenda de Umbanda Cabocla Marola do Mar. 13 de maio de 1996.
[3] Dados retirados sem alterações da Agenda Umbandista. ABTUCMM, 1999. Outras entidades da Tenda - Linhas* de Povo d’água - Cabocla Marola do Mar; de Caboclos – Caboclo Lírio Branco (Caboclo de Xangô); Cabocla Juremi (Cabocla de Oxoce); de Ogum – Ogum Sete Espadas; de Xangô - Xangô de Alafim; de Oxalá (Almas) - Preto Velho Pai Tomás; Rita Benedita; de Erê - Mariazinha; do Oriente - Princesa Iara; Ciganos – Carmem; Exús: Pomba Gira Maria Padilha; Exú Sete Capas.
Coordenador dos Trabalhos de Estudo do Evangelho: Irmão Lázaro.
* “Linha = faixa de vibração, dentro da grande corrente vibratória espiritual universal correspondente a um elemento da Natureza, representada e dominada por uma potência espiritual cósmica, um orixá também chamado Protetor e que é chefe dos seres que vibram e atuam nesta faixa afim...É subdividida em Falanges, dirigidas por representantes do orixá...” Cacciatore, 1988
[4] “Guia de frente = o mesmo que ‘orixá de frente’. Guia principal da pessoa, seu Protetor, seu anjo-da-guarda. Também ‘guia de cabeça”. Cacciatore, 1988
[5] Na parede do centro há um lembrete: “A tenda de Umbanda que freqüentas é coordenada pela entidade Cabocla Marola de Mar: é ela que zela por ti e tuas entidades. Nada é feito sem sua aprovação. O Caboclo Lírio Branco, caboclo de Xangô é a entidade encarregada pela nossa guia espiritual de dirigir todos os trabalhos de desenvolvimento, desobsessão* limpeza magnética** organização das sessões, etc. Devemos a estas entidades nosso respeito, carinho, gratidão, amor, confiança e sobretudo nosso esforço para contribuir com o bom andamento dos trabalhos”.
* Refere-se à ação de desmanchar o ato de “obsedar”. “Obsedar = perseguir. É o trabalho de correntes atrasadas que leva os perseguidos às mais tremendas situações, inclusive loucura... O obsessor, consciente ou inconsciente estende sua maléfica atuação não somente sobre uma pessoa, mas diversas...Para se livrar, devem os perseguidos procurar um centro kardecista ou de Umbanda, respeitando o que for indicado pelos protetores”. Pinto, s/d.
**“Limpar a casa = praticar atos rituais de purificação para tirar do terreiro influências espirituais negativas” Cacciatore, 1988
[6] Corrente de energia espiritual.
[7] A título de ilustração: “No dia anterior ao trabalho, o médium não deve ter relações sexuais; ficar o mais calmo possível, mentalizando coisas boas, chamando pelos guias mentalmente; evitar bebidas alcoólicas e fumar; tomar banho de descarga antes da sessão; chegar 10 minutos antes do início, acender sua vela de anjo de guarda e fazer suas orações; procurar decorar os Pontos Cantados na Banda; estar atento aos trabalho e guias para aprender; auxiliar quando necessário; manter sua pasta de médium atualizada; estudar seu conteúdo e perguntar quando tiver dúvidas; providenciar o material necessário para seus guias: cigarros, bebidas, etc.; ser pontual e não faltar, manter a mensalidade em dia; manter bom relacionamento com irmãos de fé; evitar fofocas e conversas improdutivas” Agenda Umbandista, ABTUCMM, 1999
[8] “Pai-de-cabeça = orixá masculino protetor principal de uma pessoa (homem). Tem como juntó* outro orixá feminino, a mãe. No caso de uma mulher é geralmente firmada a mãe-de-cabeça”. Cacciatore, 1988
* “Juntó = orixá auxiliar na proteção do orixá dono-da-cabeça sobre o filho. Segundo santo pessoal”. idem
[9] “Firmeza = o mesmo que segurança. Conjunto de objetos com força mística (axé) que, enterrados no chão protegem um terreiro e constituem sua base espiritual” . idem
[10] TECCV/10 anos – Publicação Especial, 1998.
[11] Agenda Umbandista, 1999 - ABTUCMM

terça-feira, 4 de maio de 2010

Jornal da ABTUCMM/ Maio





SARAVÁ PRETOS VELHOS!

SARAVÁ PAI TOMÁS!

SARAVÁ TODOS OS PRETOS VELHOS!



LEMBRETES:
Homenagem para PRETO VELHO no dia 28 de Maio com início às 20:00.
Os médiuns devem providenciar flores, vela, palheiro para oferecer aos Pretos.
***********************************
Os médiuns em desenvolvimento prestam homenagem ao Pai Tomás.
**********************************
Atendimentos: Sextas – durante a gira.
Sábados: Tratamento com o Povo do Oriente e Apometria.
*************************************
Caros Irmãos,
As consultas fora do dia normal de trabalho (sexta-feira), só acontecerão quando marcadas anteriormente, através de indicações dos guias. Estas consultas se iniciam às 18:30 horas impreterivelmente. É necessária a confirmação do comparecimento, pois muitas vezes o médium da entidade e o cambono ficam na dependência destes filhos, e eles não aparecem ou se atrasam muito e isto não é justo, pois os médiuns que se propõem a fazer o atendimento também têm seus compromissos.

CALENDÁRIO DE ATIVIDADES PERMANENTES DA A A.B.T.U.C.M.M GIRAS DE:

OGUM E POVO D`ÀGUA - Descarrego
POMBA GIRA - Atendimento
XANGÔ - Passes - Logo após, gira de CRIANÇA
PRETO VELHO - Passes, Benzeduras e atendimento
POVO DO ORIENTE - Energização
CIGANOS - atendimento
CABOCLO - Descarrego - Passes e Atendimento
EXÚ - atendimento
GIRA MISTA - Atendimento
ESTUDO DO EVANGELHO/ UMBANDA-Doutrinação e Atendimento a sofredores desencarnados e Passes nos médiuns e assistência.

O ATENDIMENTO NESTA CASA É TOTALMENTE GRATUITO. AUXILIE NOSSA ASSOCIAÇÃO, TORNANDO-SE SÓCIO.

GIRAS DE MAIO/2010:

07/05 – Estudo do Evangelho
14/05 – Ogum e Povo D’água
21/05 – Pomba Gira
28/05 – Homenagem aos Pretos Velhos

Em tudo na vida tenho mais dúvidas que certezas, isso às vezes me causa angustia... mas a verdade está lá no fim do arco-iris !!!

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“A educação é um processo lento como o florescer de uma flor; a fragrância se faz cada vez mais profunda e perceptível quando brota em silêncio, pétala por pétala, até que surja a flor completa”.Sathya Sai Baba.
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Três frases para reflexão:
1. Eu resolvo todos os meus conflitos pelo amor.
2. O aumento da sabedoria pode ser medido, com exatidão, pela diminuição do mau humor.
3. O que coloco no meu prato tem relação direta com minhas crenças e como, de verdade, desejo cuidar do meu corpo, vida e planeta.
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"A preguiça, bem como qualquer outro vício, é um atributo do ego e não do espírito, mas que reflete neste. Perdem-se grandes e valiosas oportunidades a todo instante pela insensatez de ouvirmos o ego e suas exigências. O tempo, zi fio, é oportunidade sagrada e dele se faz o que bem quer cada um. O minuto passado, não retorna mais, pois o tempo renova-se constantemente. O amanhã nos dirá o que fizemos no ontem e esse tempo que virá é nosso desconhecido, por isso não sabemos se nele ainda estaremos por aqui servindo ou se em algum lugar, clamando por ajuda de outros que poderão alegar não ter tempo para nós, pois precisam cuidar de seus umbigos." Vovó Benta
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Os fracos jamais conseguem perdoar. Charles Chaplin
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ACOLHENDO E SENDO ACOLHIDO
Sonia Dutra

Como devemos agir quando chega uma nova pessoa em nosso ambiente de trabalho, em nossa Casa Umbandista, em nossa família, em nosso núcleo de convivência ou num grupo de amigos?
Necessitamos aprender a acolher uma pessoa, um amigo novo, não só com a mente, mas com todo o corpo, procurando sentir o campo da energia do encontro entre nós e o outro. Isso nos leva a criar um espaço de serenidade e alegria que nos fará ouvir e sentir o próximo, sem que nossas mentes venham a intervir.
Acolher, nessa forma de pensar, é muito mais do que oferecer sorrisos e abraços: é dar à outra pessoa um espaço para ela ser, pois este é o presente mais precioso que se pode dar a alguém.
Muitas pessoas não sabem acolher ou serem acolhidas porque estão dominadas pelo pensamento: prestam muito mais atenção a palavras e conceitos do que ao ser da outra pessoa, que acaba ficando “escondido” atrás de palavras e de pensamentos excessivamente racionais.
Essa forma de estar com o outro é o início da realização de uma união que chamamos de AMOR. Assim, estaremos abertos ao cuidado em comunhão, e um verdadeiro encontro “Eu-Tu” acontecerá. Uma agradável relação haverá de florescer por esse caminho e minimizará os conflitos das relações. A boa relação “Eu-Tu” floresce no espaço vazio do reconhecimento de nossa humanidade no outro. O ato de acolher poderá ainda ser uma porta de entrada para a iluminação espiritual, se soubermos (Eu, que acolho, e Tu, que és acolhido) nos tornar pessoas mais amorosas e conscientes.
Qual o resultado? A verdadeira comunhão entre nós e os outros, abrindo a porta da experiência renovadora do encontro.
A tarefa de acolher exige autocuidado na relação Eu-Tu para o aprendizado do que chamamos solidariedade, e para isso a generosidade tem que estar presente. Aristóteles nos diz que “a qualidade do homem livre é a generosidade” - virtude escassa nas relações de hoje, pois valorizamos as pessoas pelo que elas têm e não pelo que são.
Como antídoto para o egoísmo, generosidade é o ato de doar. O generoso torna-se amável, capaz de amar e se deixar amar. Quem acolhe mostra-se uma pessoa compreensiva, aberta, disponível, disposta a ajudar. Não poupa simpatia, que etimologicamente significa sentir-com: sentir alegria e dor com o outro, estar com ele no prazer e no desprazer.
Acolher seria, então, a saída de si mesmo para começar a ser com os outros.
Poderíamos também finalizar dizendo que acolher é uma das maneiras de se fazer caridade? Mais do que isso: é um convite a todo trabalhador “antigo ou novo”. Para perceber, com Santo Agostinho, que sem amor a vida é desumana: “Ama e faze o que puderes”.
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O que são os Pontos Riscados?

Vemos nos terreiros vários objetos sendo usados como instrumentos de trabalho, são poderosos elementos energéticos que facilitam a ação espiritual beneficiando o assistido. Entre tantos elementos como águas, charuto, pedras, ervas, velas, toalhas, quero chamar a atenção para a PEMBA.
A pemba é um dos elementos de maior poder energético que a Umbanda tem e é usada durante, antes e depois de uma gira espiritual acontecer, além disso, é um elemento que representa e atua na Umbanda em todos os sentidos e de várias formas. Não é à toa que nos referimos aos médiuns umbandistas como “filhos de pemba”, não é à toa que a pemba não pode faltar em qualquer ato ritualístico da Umbanda, seja casamento, batizado, ato fúnebre ou mesmo nas giras assistenciais, não é à toa que, antes do atendimento assistencial, pontos são riscados pelos guias e, com certeza, conhecem coisas que nós nem fazemos ideia.
Quando ela é usada como pó junto com a energia do sopro, envolve todo o ambiente e todos os espíritos encarnados e desencarnados de forma poderosíssima, iniciando um trabalho de limpeza, harmonização ou até de descarga; claro que isso depende da composição dos elementos adicionados à pemba que está sendo utilizada e da forma que é soprada essa pemba.
Quando usada nos Pontos Riscados, o símbolo riscado transforma-se em um Símbolo Sagrado com grande Poder de Ação, traz toda a força misteriosa da “Grafia dos Orixás” que são signos e símbolos magísticos que abrem ou fecham portais, que trazem ou repelem energias, ativam ou desativam forças astrais e da natureza, portanto têm o poder de fechar, trancar, abrir, quebrar, direcionar, harmonizar, transformar, equilibrar os Terreiros, assim como os médiuns pois atuam em seus campos mediúnicos.
Importante comentar que a escrita mágica simbólica com seus infinitos signos e símbolos é tão antiga quanto a humanidade e são encontrados pelos arqueólogos em construções antiquíssimas, em túmulos, dentro de templos religiosos, lugares de cultos, seitas. Mesmo porque a comunicação escrita surge através de símbolos, traços, pontos e não através de letras como estudamos hoje. Portanto, essa escrita mágica simbólica, usada pelos guias espirituais, não é propriedade da Umbanda e sim, é um bem colocado à disposição da humanidade pelos povos antigos e pelos seres espirituais superiores que dela muito tem se servido no decorrer dos séculos.
A Pemba também é usada no médium como forma de Cruzamento, esse ato melhora a mediunidade, protege, potencializa o dom mediúnico etc. O Cruzamento com Pemba é um ritual utilizado na Umbanda importantíssimo. Sabemos que um médium de incorporação antes de iniciar seus trabalhos espirituais tem que ser cruzado abrindo e fechando canais energéticos, magnéticos e divinos.
Claro que não para por aqui, mas acredito que com essas informações dá para se ter uma idéia de como é necessário o conhecimento e o bom senso, afinal é necessário saber confeccionar e consagrar uma pemba, saber preparar as misturas e saber assoprá-las, saber o que representa, pelo menos alguns Símbolos Sagrados e suas funções, direções, energias, pontos de entrada e saída.
Saiba que, infelizmente, têm muitas pessoas riscando pontos aleatoriamente sem um pingo de cuidado e conhecimento e, com isso, estão abrindo portais negativos, ativando baixo astral e, pior, invertendo pontos Sagrados sem ao menos se darem conta do reflexo de suas ações. Saiba, o mau uso da Pemba ou do Ponto riscado pode levar a consequências imprevisíveis, comparáveis as de um leigo em assuntos de eletricidade, entrando numa casa de força e pondo-se a manejar as chaves ou embaralhando os fios, o que acabará provocando curtos-circuitos, incêndios e eletrocussões em si e nos outros.
Não podemos esquecer que simbolicamente a PEMBA é a caneta da Umbanda, é com ela que registramos todas nossas ações no Livro Sagrado da Lei.

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As Ervas (Quinta parte)
Dicas de BanhosBanho para atrair clientes e bons negócios500 gr de alpiste7 gotas de melSeparar em duas porções de 250 gr.À noite – Em 2 litros de água, cozinhe 250 gr de alpiste com 7 gotas de mel.Pela manhã – Coe e apare a água num recipiente. Depois de seu banho de higiene matinal, jogue o banho do pescoço para baixo.Quando estiver saindo de casa para o trabalho, vá jogando desde o portão de sua casa, até a porta do seu local de trabalho os 250 gr de alpiste que haviam sido previamente separadosEste banho traz muita clientela e bons negócios.
Banho para recuperar a saúde250 gr de canjica, 7 gotas de melEm 2 litros de água, cozinhe a canjica e o mel, até que a canjica fique bem molinha.Coe e apare o líquido num recipiente e depois de bem frio, jogue do pescoço para baixo.
Banho energizantePara desânimo, depressão leve, cansaço, falta de energia física.Alecrim - Antidepressivo, analgésico, estimulante e digestivo. Traz proteção, amor, purificação, saúde.Manjericão - É relaxante, antigripal, fortificante. Desperta perdão e clareza.Malva - É calmante e cicatrizante. Protege as emoções.Sálvia - Estimula a digestão, é antidepressiva. Fortalece a saúde.Canela (use no banho 3 pedaços de canela em pau. Ou em pó, 1 colher de sopa rasa) - Tem efeito tônico e revigorante.Observação: em caso de problemas renais, evite usar a canela.Mentalização: imagine que os raios de sol estão penetrando em seu corpo através do plexo solar (localizado na boca do estômago). Com os pés bem apoiados, pense que sua energia está sendo renovada, que a vontade e o desejo estão ressurgindo em todo seu ser.Banho pra começar o dia - refresca e revigora1 gota de óleo essencial de hortelã pimenta4 gotas de óleo essencial de bergamotaBanho pra dormir - relaxa para o sono1 gota de óleo essencial de camomila4 gotas de óleo essencial de lavandaBanho afrodisíaco - não precisa dizer nem pra que...1 gota de óleo essencial de ylang-ylang4 gotas de óleo essencial de sândalo1 gota de óleo essencial de jasmim
(Continua no próximo informativo)

chás (Quinta parte)

Plantas EnergéticasAlecrim (Rosmarinus officinalis)Planeta: Sol Elemento: FogoUsado em encantamentos de protecção, para ajudar nos estudos. Lavar as mãos com uma infusão de alecrim substitui um banho de purificação. Beba um chá de alecrim antes de fazer um exame ou uma entrevista para ter a mente alerta. O chá de alecrim é óptimo para trazer o ânimo de volta. Está ligado a fidelidade, amor, lembranças felizes. O cheiro de alecrim mantém a pessoa alegre, é um símbolo de amizade.Açafrão (Crocus sativus)Planeta: Sol Elemento: FogoUsado em rituais de prosperidade e cura.Alho (Allium sativum L.)Planeta: Marte Elemento: FogoErva extremamente protectora. Pode ser pendurado em casa para proteger. Também utilizado para fazer exorcismos. Os antigos gregos colocavam o bolbo do alho em um monte de pedras em um cruzamento como uma oferenda à Hécate.Amêndoas (Prunus amygdalus [doce] Amygdalus communis - amarga) Antigamente as amêndoas eram conhecidas por prevenir a intoxicação, no tempo medieval as amêndoas eram adicionadas ás refeições por esse mesmo propósito. Além disso, a amêndoa é consumida para dar inteligência.Angélica (Angelica archanegelica)Planeta: Sol Elemento: FogoA raiz dessa erva guardada em um saquinho de tecido azul, funciona como um poderoso talismã protetor. A raiz também pode ser colocada em um saquinho de tecido branco ou azul, e pendurado na janela para proteger a casa e as pessoas que moram nela de todo o mal.Anis (Pimpinela anisum)Planeta: Júpiter Elemento: ArUsado para protecção. Um travesseiro feito com anis, proporciona um sono tranquilo e sem pesadelos. É considerado um óptimo protector contra olho gordo.Avelã (Corylus spp.)Planeta: Sol Elemento: ArA madeira é apropriada para fazer qualquer tipo de bastão. Um óptimo encantamento para lhe trazer sorte consiste em fazer uma cruz solar amarrando dois galhos juntos com um cordão vermelho ou dourado.Bálsamo de Gilead (Populus candicans)Planeta: SaturnoO botão pode ser usado para curar um coração partido. Também é usado em feitiços de amor e protecção.Basílico (Ocimum basilicum)Planeta: Marte Elemento: FogoUsado em rituais de riqueza e prosperidade. Pode ser carregada no bolso para atrair dinheiro. Há tempos atrás acreditava-se que a mulher acabaria com a infidelidade do marido salpicando basil no corpo dele.Baunilha (Vanilla aromatica ou Vanilla planifolia)Planeta: Júpiter Elemento: FogoUsado para encantamentos de amor, e o óleo de baunilha tem função afrodisíaca.Benjoim (Styrax benzoin)Planeta: Sol Topo Elemento: ArUsado como incenso para purificação.

Camomila (Anthemis noblis)Planeta: Sol Elemento: ÁguaUsado em encantamentos e em rituais de prosperidades. Estimula o sono. O chá acalma e tranquiliza, pode ser muito útil quando você precisar fazer um ritual e estiver sentindo raiva ou agonia. Lavar o rosto e as mãos com camomila atrai amor. (Continua no próximo informativo)
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Redação e edição: Eldeni F. Camargo - Celular: 88036887